Pareceres
Locações
26 Junho 2025
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

Locações
PT28514 - março 2025

 

Determinada empresa nacional, que aplica o SNC (28 normas), realizou uma operação de sale & leaseback.
O bem em causa foi adquirido em janeiro de 2024 por 120 mil euros, tendo a operação de sale & leaseback ocorrido em dezembro desse mesmo ano e pelo mesmo valor.
Foi atribuído ao bem uma vida útil de 10 anos (120 meses), pelo que à data da operação o mesmo apresentava um valor líquido contabilístico de 109 mil euros, daqui resultando uma mais-valia contabilística de 11 mil euros.
A mais-valia gerada deve ser reconhecida na sua totalidade no período onde ocorreu ou diferida pelo período do contrato de leaseback?
Relativamente à depreciação, sendo o valor líquido do bem novamente 120 mil euros, e uma vez que o bem foi readquirido pelo valor de novo estando já depreciado, a mesma deverá ocorrer pelo mesmo período (120 meses) a partir de dezembro de 2024 ou apenas pelo período remanescente (109 meses)?
É possível que esta operação seja vista apenas como um financiamento e que, por isso, apenas haja o registo do passivo pelo crédito atribuído pelo locador?

 

Parecer técnico

 

O pedido de parecer está relacionado com o tratamento contabilístico de uma operação de venda seguida de locação de bens. No caso em apreço assumimos que o bem estava reconhecido como ativos fixos tangíveis.
De referir que o enquadramento contabilístico e fiscal não está dependente dos aspetos formais da operação, atendendo antes à natureza económica da operação.
Em termos contabilísticos, uma locação é um acordo pelo qual o locador transmite ao locatário, em troca de um pagamento ou série de pagamentos, o direito de usar um ativo por um período acordado. Nesta definição, é enquadrável a operação em causa, face à descrição fornecida.
Nos termos do parágrafo 6 da NCRF 9, a definição de uma locação inclui contratos para a locação de um ativo que contenha uma cláusula que dê àquele que toma de locação, uma opção para adquirir o direito ao ativo após o cumprimento das condições acordadas.
O tratamento contabilístico das locações está previsto na norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) n.º 9 - Locações.
Os parágrafos 44 a 51 da NCRF 9 tratam das transações de venda seguidas de locação, comummente conhecidas como operações de «venda e leaseback».
No fundo, o que está em causa neste tipo de operações é que uma entidade proprietária de um bem, principalmente devido a necessidades de financiamento, vende o bem de sua propriedade a uma entidade locadora, com o objetivo desta ao mesmo tempo voltar a locar o bem à mesma entidade, agora na condição de locatária.
Na prática, o bem não chega a deixar de ser usado na atividade da entidade vendedora, apesar da transferência legal da propriedade do bem passar para a entidade locadora, tratando-se de meras operações com caráter de financiamento.
A entidade ao mesmo tempo vendedora e locatária não deixa de deter o controlo na gestão do bem, continuando a deter todos os riscos e vantagens por essa detenção do bem, apesar da operação de venda e leaseback.
A NCRF 9 estabelece que o tratamento contabilístico de uma transação de venda seguida de locação (venda e leaseback) depende do tipo de locação envolvido.
Para se determinar se uma locação pode ser classificada como locação financeira, haverá que analisar a substância da transação e não a forma do contrato. Os parágrafos 10 e 11 da NCRF 9 estabelecem alguns indicadores que possam indicar que uma locação se pode classificar como locação financeira, nomeadamente:
• A locação transfere a propriedade do ativo para o locatário no fim do prazo da locação;
• O locatário tem a opção de comprar o ativo por um preço que se espera que seja suficientemente mais baixo do que o justo valor à data em que a opção se torne exercível tal que, no início da locação, seja razoavelmente certo que a opção será exercida;
• O prazo da locação abrange a maior parte da vida económica do ativo ainda que o título de propriedade não seja transferido;
• No início da locação o valor presente dos pagamentos mínimos da locação ascende a pelo menos, substancialmente, todo o justo valor do ativo locado; e
• Os ativos locados são de uma tal natureza especializada que apenas o locatário os pode usar sem que sejam feitas grandes modificações.
Outros indicadores de situações que individualmente ou em combinação podem também conduzir a que uma locação seja classificada como financeira são:
- Se o locatário puder cancelar a locação, as perdas do locador associadas ao cancelamento são suportadas pelo locatário;
- Os ganhos ou as perdas da flutuação no justo valor do residual serem do locatário (por exemplo sob a forma de um abatimento na renda que iguale a maior parte dos proventos das vendas no fim da locação); e
- O locatário tem a capacidade de continuar a locação por um segundo período com uma renda que seja substancialmente inferior à renda do mercado.
Se o contrato de locação não cumprir qualquer destes indicadores, deverá ser classificado como uma locação operacional.
Pressupondo que a operação leaseback origina uma locação financeira, há que analisar os registos contabilísticos:
Se a transação de venda seguida de locação (venda e leaseback) resultar numa locação financeira, qualquer excesso do proveito da venda (obtenção de mais-valias) sobre a quantia escriturada não deve ser imediatamente reconhecido como rendimento pelo vendedor-locatário, mas sim diferido e amortizado durante o prazo da locação.
A NCRF 9 refere no parágrafo 53 que, se a venda seguida de locação (venda e leaseback) resultar numa locação financeira, esta transação não será mais que um meio pelo qual o locador proporciona meios financeiros ao locatário, com o ativo como garantia.
Devido à natureza deste tipo de operações, que têm um caráter de financiamento, e não de venda dos bens, a NCRF 9 estabelece que não é apropriado considerar como rendimento o excesso do produto da venda sobre a quantia escriturada (a mais-valia obtida), devendo essa eventual mais-valia ser diferida e amortizada durante o prazo da locação.
A expressão «diferida» e «amortizada» não deve ser entendida como diferimento do rendimento, para ser reconhecido como rendimento nos períodos ao longo do novo contrato de locação, como acontecia no anterior normativo contabilístico (diretriz contabilística n.º 25/98).
As expressões de diferimento e amortização devem ser entendidas como a amortização do capital em dívida do contrato de locação, ou seja, nunca se deve reconhecer o eventual ganho obtido (mais-valia) com a venda do bem face ao seu valor líquido contabilístico (quantia escriturada), sendo que esse excesso resultante da venda do bem sujeito a nova locação, fará parte do novo valor da dívida do contrato de locação, que será amortizado ao longo do prazo desse contrato pelo pagamento das respetivas rendas.
Aliás, este entendimento vai de encontro às normas fiscais previstas no artigo 25.º do Código do IRC e no artigo 13.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009.
Estas normas fiscais estabelecem que nas operações de relocação financeira (venda seguida de locação financeira), não haverá que apurar qualquer resultado tributável em consequência dessa operação, continuando o bem a ser depreciado de acordo com o regime que vinha sendo adotado.
Idêntico raciocínio deve ser efetuado se em vez de mais-valia a operação gerar menos-valia.
Assim sendo, de acordo com estas regras contabilísticas, os registos contabilísticos para uma operação de venda seguida de locação financeira, na ótica do vendedor-locatário, devem ser os seguintes:
Pelo contrato de locação financeira e recebimento do valor acordado com a locadora pela "venda" do imóvel:
12 - Depósitos
a
2513 - Locação financeira
Pelo justo valor do bem (idêntico ao valor presente dos pagamentos mínimos da locação).
Pela contabilização das rendas do contrato de locação financeira:
2513 - Locação financeira
6911 - Juros de financiamentos obtidos
6981 - Outros relativos a financiamentos obtidos - outros encargos
a
12 - Depósitos
Não está previsto qualquer registo de desreconhecimento (pela venda) e novo reconhecimento (pelo contrato de locação financeira) do ativo fixo tangível, uma vez que este tipo de operações terá uma natureza meramente de financiamento, não se tratando de uma retirada efetiva do bem do ativo da entidade.
Com efeito, face ao princípio contabilístico da substância sob a forma, prevalece a realidade financeira da operação (mero financiamento), não se atendendo à forma legal de que se reveste a operação (venda seguido de locação financeira).
No caso de efetuar estes registos contabilísticos pela operação de venda seguida de locação financeira (venda e leaseback), não se apura qualquer ganho ou perda por esta operação, não tendo, portanto, que efetuar qualquer correção fiscal a nível de IRC, uma vez que este procedimento está em consonância com a regra fiscal prevista no artigo 25.º do CIRC.
Este é o nosso entendimento com base no princípio da substância sobre a forma.
Contudo, existem outros especialistas da área contabilística, nomeadamente a Comissão de Normalização Contabilística, que entende não existir diferença entre o normativo anterior (POC e DC) e a NCRF 9 no tratamento das operações de venda e leaseback, conforme resulta da resposta dada em fevereiro de 2010 (pergunta 7).
Considerando que apesar de não se reconhecer um rendimento pelo excesso obtido (mais-valia) na operação de venda e leaseback, logo no período em que ocorre essa operação, esse excesso deve ser reconhecido nos resultados (como rendimento) nos períodos seguintes em que durar o contrato de locação.
Segundo este outro entendimento, as expressões «diferido» e «amortizado» previsto na NCRF 9 têm um significado semelhante a «diferido e imputado a resultados numa base sistemática durante o prazo da locação» previsto na DC 25.
Segundo este entendimento, o registo contabilístico da operação de venda seguida de locação financeira deve ser o seguinte:
438 - Ativos fixos tangíveis - Depreciações acumuladas e/ou da conta
439 - Ativos tangíveis - Perdas por imparidade acumuladas
a
43 - Ativos fixos tangíveis
Pelo valor das depreciações e perdas por imparidade acumuladas, para determinação da quantia escriturada do imóvel;
Pela venda do bem à locadora:
12 - Depósitos
28 - Gastos a reconhecer pelo valor da perda obtida (menos-valia = diferença negativa entre o valor obtido pelo contrato de leaseback e quantia escriturada), se aplicável.
a
43 - Ativos fixos tangíveis
Pelo contrato de locação financeira:
43 - Ativos fixos tangíveis
a
2513 - Locação financeira
Durante os períodos contabilísticos em que decorra o contrato de locação:
Pelo reconhecimento como gasto da parte da perda obtida pela operação de venda seguida de locação financeira (de uma forma proporcional pelo número de anos do contrato de locação financeira):
6871 - Alienações
a
282 - Gastos a reconhecer
Pela parte proporcional do rendimento a reconhecer (se aplicável).
Em termos fiscais, efetuando-se este último procedimento contabilístico, há que efetuar as devidas correções ao resultado tributável face ao disposto no artigo 25.º do CIRC e no artigo 13.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009.
Note-se que, o artigo 25.º do Código do IRC é apenas aplicável à venda seguida de locação financeira e não à venda seguida de locação operacional.
Desta forma, há que acrescer no quadro 07 da declaração modelo 22, em cada período durante o prazo da locação, o valor da perda reconhecida pela venda do imóvel.
Por outro lado, haverá que deduzir ao quadro 07 da declaração da modelo 22, a diminuição de depreciações face ao custo inicial do imóvel, que resulte da diminuição do valor do ativo fixo tangível, em resultado desta operação de venda seguida de locação financeira.
Este nosso parecer apresenta dois entendimentos completamente diferentes para o tratamento deste tipo de operações, cabendo à entidade e ao contabilista certificado a decisão pela aplicação do procedimento contabilístico que se adequar ao caso em concreto.
O tratamento aqui referido como «alternativo» é um entendimento dado pela Comissão de Normalização Contabilística, que é o órgão normalizador da contabilidade em Portugal. No entanto, tal entendimento, tendo sido veiculado através de uma FAQ, tem um caráter meramente informativo.
O artigo 25.º do CIRC estabelece que, no caso de entrega de um bem objeto de locação financeira ao locador seguida de relocação desse bem ao mesmo locatário, não há lugar ao apuramento de qualquer resultado para efeitos fiscais em consequência dessa entrega, continuando o bem a ser depreciado ou amortizado para efeitos fiscais pelo locatário, de acordo com o regime que vinha sendo seguido até então.
No caso de venda de bens seguida de locação financeira, pelo vendedor, desses mesmos bens, observa-se o seguinte:
- Se os bens integravam os inventários do vendedor, não há lugar ao apuramento de qualquer resultado fiscal em consequência dessa venda e os mesmos são valorizados para efeitos fiscais ao custo inicial de aquisição ou de produção, sendo este o valor a considerar para efeitos da respetiva depreciação;
- Nos restantes casos, é aplicável o disposto no n.º 1, com as necessárias adaptações.
Por seu turno, o artigo 13.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009 estabelece no seu n.º 1 que as depreciações ou amortizações dos bens objeto de locação financeira são gastos do período de tributação dos respetivos locatários, sendo-lhes aplicável o regime geral constante do Código do IRC e do presente decreto regulamentar.
O n.º 2 vem estabelecer que a transmissão dos bens locados, para o locatário, no termo dos respetivos contratos de locação financeira, bem como na relocação financeira prevista no artigo 25.º do Código do IRC, não determinam qualquer alteração do regime de depreciações ou amortizações que vinha sendo seguido em relação aos mesmos pelo locatário.
Ou seja, em termos fiscais o leaseback é neutral, quer ao nível das mais ou menos-valias, quer ao nível das depreciações.
O leaseback, conforme referido anteriormente, trata-se dum contrato de locação financeira com a particularidade de a locadora comprar o bem à empresa que passará a ser a sua locatária.