PT28565 – Subsídios
Abril, 2025
No ano de 2024, determinada empresa recebeu uma notificação para proceder à devolução de um valor indevidamente pago. Efetuou-se a devolução na sua totalidade (115 042,93 euros). Quando se está perante a devolução de incentivos, qual o tratamento fiscal a aplicar?
Parecer Técnico
O pedido de parecer está relacionado com o enquadramento contabilístico e fiscal, no que se refere à devolução de subsídios.
Considerando que não nos é informado as normas contabilísticas adotadas pelas entidades, a resposta será baseada nas Normas Contabilísticas e de Relato Financeiro (NCRF). Em todo o caso, para a questão em apreço, o procedimento é idêntico em todos as normas contabilísticas.
A contabilização dos subsídios deve atender aos procedimentos previstos na Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) 22 - "Subsídios e Outros Apoios das Entidades Públicas".
O tratamento contabilístico dos subsídios não reembolsáveis, nomeadamente o reconhecimento e apresentação nas demonstrações financeiras, é diferente dependendo do fim a que se destina.
O princípio contabilístico a ter em atenção na contabilização dos subsídios é o princípio do balanceamento entre rendimentos e gastos, devendo o subsídio ser reconhecido nos rendimentos do período, no momento e na mesma proporção, em que for reconhecido o gasto subsidiado, conforme previsto no parágrafo 14 da NCRF 22.
Em termos de reconhecimento dos subsídios, em primeiro há que identificar o momento que esse subsídio deve ser inicialmente reconhecido nas demonstrações financeiras.
No Balanço, o subsídio deve ser inicialmente reconhecido quando exista segurança de que a entidade cumprirá as condições a ele associadas e de que os mesmos serão recebíveis, independentemente de ainda não ter sido efetivamente recebido, conforme previsto nos parágrafos 8 e 9 da NCRF 22.
Normalmente, com a aprovação da atribuição do apoio financeiro pela entidade gestora da medida de apoio, estão cumpridos os critérios de reconhecimento do subsídio, pelo que o mesmo pode ser sido reconhecido no balanço nesse período. Mas, é possível que esse reconhecimento inicial possa apenas ser efetuado num período posterior.
Para determinar o momento do reconhecimento inicial do subsídio, a entidade deve efetuar um juízo de valor e julgamentos sobre a sua capacidade para cumprir as condições associadas ao subsídio atribuído, ainda que se trate de objetivos a alcançar em períodos futuros.
Com base nesses juízos de valor e julgamentos, deve efetuar estimativas para o cálculo do montante do subsídio a ser atribuído.
Os fatores a ter conta para a realização dessas estimativas e julgamentos devem ser aqueles diretamente relacionados com a execução do investimento e operação do projeto proposto na candidatura ao subsídio.
Tal como decorre do parágrafo 26 da NCRF 4 - "Políticas Contabilísticas, Alterações nas Estimativas Contabilísticas e Erros", o uso de estimativas é uma parte essencial da preparação de demonstrações financeiras e não diminui a sua fiabilidade, devendo ser objeto de revisões periódicas.
Na demonstração dos resultados, para o reconhecimento, há que ter em atenção o referido princípio do balanceamento entre rendimentos e gastos.
Os subsídios atribuídos devem ser reconhecidos nos resultados (rendimentos) do período na mesma proporção dos respetivos custos subsidiados incorridos pela entidade e reconhecidos como gastos do período, tendo também em atenção o pressuposto do regime do acréscimo, ou seja, deve ser reconhecido independentemente do momento do recebimento.
Em termos de apresentação nas demonstrações financeiras, de acordo com os parágrafos 22 e 25 da NCRF 22, os subsídios não reembolsáveis relacionados com a aquisição ou produção de um ativo (fixo tangível ou intangível) (também conhecidos como subsídios ao investimento), devem ser apresentados como componente do capital próprio (conta 593 e rubrica "Outras variações no capital próprio"), e imputados como rendimentos do exercício (conta 7883) numa base sistemática e racional durante a vida útil do ativo, ou seja, pela proporção da depreciação ou amortização do ativo fixo tangível ou ativo intangível, respetivamente.
Os subsídios relacionados com rendimentos (conhecidos como subsídios à exploração), que são concedidos para assegurar uma rentabilidade mínima ou compensar deficits de exploração de um dado exercício imputam-se como rendimentos desse período (conta 75), ou de período futuros, se se destinarem também a assegurar rentabilidades mínimas ou a compensar deficits de exploração desses períodos futuros, mais uma vez tendo presente o princípio do balanceamento entre rendimentos e gastos e o pressuposto do regime do acréscimo.
No caso em concreto, estamos perante a devolução de um subsídio, pelo que se a entidade vier a constatar que não irá receber o valor total ou parcial do subsídio reconhecido inicialmente, há que atender aos procedimentos previstos na NCRF 22 para o reembolso de subsídios.
Nos termos dos parágrafos 29 a 31 da NCRF 22, um subsídio que se torne reembolsável deve ser contabilizado como uma revisão de uma estimativa contabilística, ou seja, com tratamento prospetivo, que origina afetação aos resultados do período ou de períodos futuros, e não a correções de resultados de períodos anteriores.
O reembolso de um subsídio relacionado com rendimentos deve ser aplicado em primeiro lugar em contrapartida das componentes onde se encontrem refletidas as importâncias ainda não imputadas como rendimento.
Na medida em que o reembolso exceda tais componentes, ou quando estas não existam, o reembolso deve ser reconhecido imediatamente como um gasto nos resultados do período.
Tratando-se de um subsídio relacionado com ativos, o registo contabilístico da reclassificação do subsídio de não reembolsável para reembolsável pode ser o seguinte:
Se ainda não foi reconhecido como rendimento:
- Débito da conta 5931 - "Subsídios atribuídos" por contrapartida a crédito da conta 278x - "Outros devedores e credores - Entidade gestora", pela quantia escriturada transformada em subsídio reembolsável.
Pela anulação do ajustamento de imposto referente ao subsídio relacionado com ativos:
- Débito da conta 278y - Outros devedores e credores - ajustamentos em subsídios" por contrapartida a crédito da conta 5932 - "Ajustamentos em subsídios", pelo montante do ajustamento de subsídios (ver FAQ 13 da Comissão de Normalização contabilística).
Se já foi reconhecimento como rendimentos:
- Débito da conta 688 - "Outros gastos" por contrapartida a crédito da conta 278x - "Outros devedores e credores - Entidade gestora", pela quantia escriturada transformada em subsídio reembolsável.
Se se tratar de um subsídio relacionado com rendimentos, o registo contabilístico da reclassificação do subsídio de não reembolsável para reembolsável pode ser o seguinte:
Pelo desreconhecimento do subsídio:
Se ainda não tiver sido reconhecido como rendimento em períodos anteriores:
- Débito da conta 282 - "Rendimentos a reconhecer" por contrapartida a crédito da conta 278x - "Outros devedores e credores - Entidade gestora da medida de apoio", pela quantia escriturada transformada em subsídio reembolsável.
Se já tiver sido reconhecido como rendimento em períodos anteriores:
- Débito da conta 688x - "Outros gastos e perdas - Outros" por contrapartida a crédito da conta 278x - "Outros devedores e credores - Entidade gestora da medida de apoio", pela quantia escriturada transformada em subsídio reembolsável.
Pela devolução do subsídio recebido em excesso
- Débito da 278x - "Outros devedores e credores - Entidade gestora da medida de apoio", por contrapartida a crédito da 12 - Depósitos à ordem, pela quantia a devolver.
A data relevante para determinar que o subsídio não reembolsável se tornou reembolsável é a data da comunicação da obrigação de efetuar o reembolso do subsídio atribuído devido a incumprimento.
Caso o lançamento contabilístico relativo à reclassificação do subsídio de não reembolsável para reembolsável, passe por movimentar uma conta de gastos (conta 688x - "Outros gastos e perdas - Outros"), pelo facto do subsídio já ter sido reconhecido em períodos anteriores, importa atender ao enquadramento fiscal da operação.
Em termos de IRC, tendo sido tributado o subsídio, o gasto referente à devolução do subsídio é aceite como gasto em termos fiscais nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.
Por outro lado, e em qualquer um dos casos, caso tenha existido um erro contabilístico no reconhecimento da estimativa do cumprimento dos requisitos para o reconhecimento do subsídio, há que proceder à correção desse erro contabilístico de acordo com o procedimento da reexpressão retrospetiva previsto nos parágrafos 32 a 39 da NCRF 4.
Se existia informação disponível e acessível à empresa para determinar com razoabilidade e fiabilidade as condições subjacentes à atribuição do subsídio em causa não iriam ser cumpridas, e essa informação não foi tida em conta por lapso ou negligência, tal constitui um erro contabilístico que afetou resultados de períodos anteriores.
As correções de erros materiais em demonstrações financeiras de períodos anteriores devem ser efetuadas através do procedimento de reexpressão retrospetiva, conforme previsto na NCRF 4 - "Políticas contabilísticas, alterações nas estimativas contabilísticas e erros".
Quando esses erros afetem resultados de períodos anteriores, sendo situações materialmente relevantes, devem ser imputados à conta de resultados transitados e implicar a reexpressão retrospetiva desde o período comparativo mais antigo apresentado, conforme previsto nos parágrafos 32 a 39 da NCRF 4.
Apenas podem ser utilizadas as contas de perdas e ganhos do período corrente (correções de exercícios anteriores), quando os erros respeitarem a situações que não sejam materialmente relevantes, não sendo importante a reexpressão retrospetiva para a análise da informação comparativa das demonstrações financeiras, não se aplicando, portanto, os procedimentos da NCRF 4.
Assim, caso se verifique que estamos perante um erro contabilístico, os procedimentos contabilísticos serão semelhantes aos anteriormente explanadas, com a exceção de, em primeiro lugar, a correção ter um efeito retrospetivo, e caso o erro tenha afetado os resultados de exercícios anteriores, a correção do erro, se for considerado material, deve ser refletido nos resultados transitados (conta 56). Sendo considerado imaterial, a correção deste erro deve ser refletida nos resultados do período corrente (p.e. conta 6881 ou 7881).
Fiscalmente, independentemente do procedimento contabilístico utilizado (material ou não), esta correção de um erro relativo a factos que afetem resultados de períodos de tributação anteriores, nunca deve afetar o lucro tributável do período corrente, conforme o n.º 1 e 2 do artigo 18.º do CIRC.
Pressupondo que se trata da correção de erros materiais com contabilização na conta 56 - "Resultados transitados", não há que proceder a qualquer correção ao lucro tributável no Quadro 07 da Modelo 22 do período de tributação do período corrente, pois essas operações de períodos anteriores indevidamente contabilizadas não são consideradas como variações patrimoniais positivas ou negativas relevantes para efeitos fiscais.
No entanto, tratando-se da correção de erros considerados imateriais com a contabilização nas contas 6881 ou 7881, estes valores não podem afetar o lucro tributável do período corrente, devendo ser acrescidos ou deduzidos, respetivamente, no quadro 07 da Modelo 22.
Quanto à substituição da declaração do período em que ocorreu o erro, importa atender ao artigo 122.º do CIRC que no seu n.º 1 dispõe que "quando tenha sido liquidado imposto inferior ao devido ou declarado prejuízo fiscal superior ao efetivo, pode ser apresentada declaração de substituição, ainda que fora do prazo legalmente estabelecido, e efetuado o pagamento do imposto em falta."
Já o n.º 2 do mesmo artigo refere que "[a] autoliquidação de que tenha resultado imposto superior ao devido ou prejuízo fiscal inferior ao efetivo pode ser corrigida por meio de declaração de substituição a apresentar no prazo de um ano a contar do termo do prazo legal."