PT19582 - Ativos intangíveis
01-08-2017
Uma empresa concessionária de uma marina para o período de 30 anos
cedeu a sua concessão a outra empresa, com autorização do concedente, mediante
um preço.
A nova empresa concessionária reconheceu esse preço como um ativo
intangível.
A sua mensuração subsequente deve ser efetuada pelo modelo de custo ou
pelo justo valor?
A vida útil deve ser finita e correspondente ao período da concessão?
A depreciação contabilística é fiscalmente aceite?
Caso só comece a depreciar após o quarto exercício incorre em taxas
perdidas?
Parecer técnico
A questão colocada refere-se ao
tratamento contabilístico da mensuração subsequente de um ativo intangível,
referente à aquisição de um direito de concessão de exploração de uma marina.
O tratamento contabilístico dos
ativos intangíveis está previsto na Norma Contabilística e de Relato Financeiro
(NCRF) n.º 6 - "Ativos intangíveis".
De acordo com o parágrafo 70 da
NCRF 6, uma entidade deve escolher ou o modelo de custo ou o modelo de
revalorização como sua política contabilística, para a mensuração subsequente
dos ativos intangíveis.
Como se constata, a NCRF 6 não
prevê a utilização do modelo de justo valor para a mensuração dos ativos
intangíveis, mas antes o modelo de revalorização.
Todavia, o modelo de
revalorização apenas pode ser utilizado quando exista um mercado ativo para o
ativo intangível em causa.
O parágrafo 76 da NCRF 6 refere
que não é habitual a existência de mercado ativo para os ativos intangíveis,
atendendo à sua natureza e especificidade, apesar deste poder existir em
determinados casos.
Para os direitos de concessão de
exploração da marina, não existe certamente um mercado ativo, até porque se
trata da exploração daquela marina específica, sendo improvável que se possa
determinar um valor de mercado para tal ativo intangível.
Face a estas limitações,
normalmente os ativos intangíveis não podem ser mensuração pelo modelo de
revalorização, devendo ser utilizado o modelo do custo.
No caso em concreto, não
existindo um mercado ativo para os direitos de concessão de exploração da
marina em causa, a entidade deve efetuar a mensuração desse ativo intangível
pelo modelo do custo.
No modelo do custo, o ativo
intangível deve ser escriturado pelo seu custo menos qualquer amortização
acumulada e quaisquer perdas por imparidade acumuladas, conforme previsto no
parágrafo 72 da NCRF 6.
As amortizações do ativo
intangível são determinadas em função da estimativa da vida útil e do eventual
valor residual.
A estimativa da vida útil do
ativo intangível é efetuada com base no período que se espera este venha a ser
utilizado no decurso do exercício da atividade da entidade.
No caso em concreto, atendendo a
que se trata de um direito de concessão de exploração da marina, temporariamente
por um período definido em termos contratuais, a vida útil desse ativo
intangível deve ser estimada em função do período definido no contrato e das
possíveis renovações previstas, que não representem qualquer custo adicional
para a entidade.
As amortizações contabilizadas de
acordo com a estimativa de vida útil, efetuadas com base no período do contrato
de concessão, são aceites em termos fiscais, por enquadramento no Código 2475
da Tabela II - Taxas genéricas, Anexa ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009.
Nos termos do parágrafo 95 da
NCRF 6, a amortização do ativo intangível deve começar quando este estiver
disponível para uso, i.e. quando estiver na localização e condição necessárias
para que seja capaz de operar da forma pretendida.
O direito de concessão deve ser
amortizado a partir do momento em que a entidade o possa utilizar na sua
atividade, não podendo existir qualquer diferimento desse início da
contabilização das amortizações.
Caso não se efetuem amortizações
a partir desse momento inicial, em que a empresa pode utilizar o direito de
concessão da marina, tal constitui um erro contabilístico.
Se o erro contabilístico for
considerado material para a preparação das demonstrações financeiras da
entidade, este deve ser corrigido nos termos da NCRF 4 - "Políticas
Contabilísticas, Alterações nas Estimativas Contabilísticas e Erros".
A não contabilização de
amortizações em períodos anteriores trata-se de um erro contabilístico com
efeitos nos resultados desses períodos anteriores, devendo proceder-se à
respetiva correção nos termos dos parágrafos 32 a 39 da NCRF 4.
De acordo com esse procedimento
contabilístico, a correção de erros materiais de períodos anteriores deve ser
efetuada através de reexpressão retrospetiva.
A reexpressão retrospetiva
implica dois procedimentos:
1.º O registo no período corrente
em resultados transitados, quando esses erros tenham influenciado os resultados
do(s) período(s) anterior(es);
2.º E, pela correção da
informação comparativa das quantias comparativas desse(s) período(s)
anterior(es) apresentados nas demonstrações financeiras do período corrente,
até ao limite do período mais antigo apresentado, em que se deve reexpressar os
saldos de abertura dos ativos, passivos e capitais próprios (resultados
transitados).
A correção de erros materiais de
períodos anteriores nunca deve ser reconhecida nos resultados do período
corrente em que se esteja a efetuar a correção.
Tratando-se da incorreta
contabilização de amortizações de ativos intangíveis, tal correção necessária pode
ser considerada como correção a um erro material, devendo ser aplicado o
procedimento previsto na NCRF 4.
A questão da avaliação, se uma
determinada operação (facto ou transação) é material, ou não, deve ser efetuada
pela entidade em causa, não dependendo exclusivamente dos montantes em causa,
mas também da natureza e dimensão das operações, e da situação económica e
financeira da própria entidade, conforme previsto nos parágrafos 29 e 30 da
Estrutura Conceptual do SNC.
O que a entidade deve verificar para
efetuar esse juízo de valor na determinação da materialidade é aferir se esse
erro influencia a tomada de decisão dos utilizadores das demonstrações
financeiras.
Se considerar que esse erro
influenciou essa tomada de decisão, deve-se considerar o erro como material, e
proceder à reexpressão retrospetiva, ou seja, refletir na informação
comparativa das demonstrações financeiras, a correção do erro de modo a efetuar
os ajustamentos necessários para que estas apresentem a informação como se o
erro nunca tivesse ocorrido. No período corrente, o efeito desse erro material
passa a estar refletido nos resultados transitados, pois decorre da correção
nos resultados do período anterior.
Se considerar que o erro é
imaterial, pode não aplicar a NCRF 4, e corrigir o erro, que afetou resultados
de períodos anteriores, nos resultados do período corrente (p.e. conta 6881 ou
7881 - "Correções relativas a períodos anteriores").
Como se percebe é muito
diferente, imputar o erro a resultados de anos anteriores (transitados) ou ao
resultado do período, principalmente se tiver existido a alteração do órgão de
gestão entre esses dois períodos.
Com certeza, se um gestor deteta
um erro nas contas de períodos anteriores, em que não detinha a gestão, não
querer afetar os resultados do período que lhe compete.
O objetivo principal da
necessidade de se proceder à reexpressão retrospetiva de erros materiais está
fundamentalmente relacionado com a necessidade da existência de comparabilidade
na informação financeira, nomeadamente entre diferentes períodos.
Se estas correções derem origem
ao reconhecimento de gastos para a empresa relativos a períodos anteriores,
esses encargos não são aceites como gasto fiscal, pois deve ser respeitado o
princípio do regime do acréscimo dos períodos previsto no artigo 18.º do Código
do IRC (CIRC).
Este artigo refere que os
encargos devem ser considerados como gastos fiscais de determinado período de
tributação, quando economicamente lhe sejam imputáveis, podendo, no entanto
serem aceites fiscalmente gastos respeitantes a períodos de tributação
anteriores, quando na data de encerramento das contas daquele período a que
deveriam ser imputadas serem imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos.
No entanto, quando esses gastos
de períodos anteriores respeitarem a erros contabilísticos, ou outros, do
próprio contribuinte, não devem ser considerados como "imprevisíveis ou
manifestamente desconhecidos", pois não decorrem de situações externas que
aquele não poderá controlar. Tal entendimento foi veiculado, pelo Acórdão do
Supremo Tribunal Administrativo, de 25.06.2008 - Processo: 0291/08.
No caso de ativos intangíveis,
cujas amortizações não foram contabilizadas ou não foram contabilizadas
corretamente, implicando um aumento do gasto dessas amortizações, o mesmo não
pode ser deduzido fiscalmente.
O gasto de amortizações, não
tendo sido contabilizado nos respetivos períodos de tributação, já não pode ser
aceite como gasto fiscal nesses períodos anteriores, ainda que efetue a entrega
da declaração Modelo 22 de substituição desses períodos anteriores, conforme
previsto no n.º 3 do artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009.
As amortizações apenas podem ser
consideradas como gastos fiscais, quando forem contabilizadas como tal no
período a que digam respeito, de acordo com o princípio do regime do acréscimo
previsto no artigo 18.º do CIRC. No caso de não se terem contabilizado as
amortizações em determinado período, não se pode considerar esse gasto em
períodos futuros, dando-se como quotas perdidas tais montantes de amortização.
Efetivamente, as quotas perdidas
são os montantes de quotas mínimas de amortização não contabilizados como
gastos do período a que respeitam, ou contabilizadas por uma quota inferior à
mínima, ou seja, com uma amortização para além do período máximo de vida útil.
Tais situações designam-se como quotas perdidas uma vez que em ambas as
situações já não podem ser consideradas tais amortizações como gastos fiscais
em períodos futuros, de acordo com o n.º 1 do Artigo 18.º do referido Decreto
Regulamentar.
No "Mapa de depreciações e
amortizações - Modelo 32", quanto às amortizações dos períodos anteriores,
não deduzidas fiscalmente, estas devem ser consideradas como quotas perdidas,
havendo que incluir no mapa (coluna 14) a respetiva taxa acumulada de quotas
perdidas até ao período corrente.
Essa taxa perdida acumulada
corresponde à percentagem relativa às quotas perdidas, nas situações em que foi
utilizada uma taxa abaixo da mínima aceite fiscalmente, nomeadamente referente
a amortizações não contabilizadas nos períodos anteriores.
No Anexo, deve efetuar
divulgações relativamente aos erros materiais que foram objeto de correção,
identificando a natureza, a quantia das correspondentes correções para cada
período anterior apresentado e quantia das correspondentes correções no início
do período anterior mais antigo apresentado.
Caso exista, também deve ser
divulgada a impraticabilidade de reexpressão retrospetiva para um período
anterior em particular. Indicação das circunstâncias que levaram à existência
dessa condição e descrição de como e desde quando o erro foi corrigido.