Contabilista – É o rosto do projeto de educação e literacia financeira MoneyLab, que se desdobra em podcasts, redes sociais e cursos, tendo por mote que esta é uma das ferramentas para transformar a sociedade. Qual é o balanço que faz das experiências e interações promovidas por este laboratório especializado nos 11 anos da sua existência?
Bárbara Barroso – O balanço destes 11 anos é profundamente positivo e, acima de tudo, transformador. O MoneyLab nasceu com um propósito muito claro: democratizar o acesso ao conhecimento financeiro e ajudar as pessoas a tomarem melhores decisões financeiras. Num país com níveis de literacia ainda preocupantes, sabíamos que o impacto não podia ser apenas teórico, mas sim real, tangível e mensurável nas vidas das pessoas. Ao longo destes anos, foram milhares as vidas impactadas, desde pessoas que superaram dívidas, começaram a investir, tomaram decisões conscientes e, sobretudo, ganharam mais autonomia. Essa transformação é o verdadeiro retorno do nosso trabalho. Continuamos a crescer, com mais formação, mais eventos, mais formatos e projetos, mas a missão continua a mesma: ajudar as pessoas a tomarem melhores decisões financeiras e contribuir para mais e melhor educação e literacia financeira, de forma que Portugal saia da cauda da Europa. Sempre fazendo diferente, e fazendo a diferença.
O Moneylab foi recentemente considerado entidade formadora certificada pela DGERT (Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho). Este selo de garantia poderá levar o projeto de descomplicar o mundo das finanças pessoais a um público mais vasto?
A certificação pela DGERT é um selo de qualidade, sim, mas é também uma credencial que abre portas: junto de entidades públicas, escolas, empresas e parceiros institucionais. Num país onde a literacia financeira ainda é vista como “extra”, esta certificação reforça o nosso papel como entidade formadora de referência. É um reconhecimento oficial da robustez da nossa metodologia pedagógica, que é validada agora também por critérios técnicos e rigorosos definidos pelo Estado. Esta certificação atesta que o que fazemos é mais do que comunicar bem: é formar com qualidade, estrutura e impacto.
Além do prestígio institucional, traz vantagens muito concretas para os formandos: os cursos certificados passam a ser dedutíveis em sede de IRS, contam para o cumprimento das 40 horas de formação obrigatória anual nas empresas e são reconhecidos para efeitos de valorização curricular e profissional. Num país que precisa urgentemente de mais e melhor literacia financeira, esta certificação permite-nos chegar ainda mais longe com mais legitimidade, mais acessibilidade e mais impacto.
Em setembro começa a lecionar uma masterclass chamada «Investir Agora». Ter o dinheiro parado, em vez de rentabilizá-lo, é um erro que muitas pessoas cometem nas suas poupanças?
Sem dúvida. O dinheiro parado é um luxo ao qual já não podemos dar-nos. Num cenário de inflação persistente, quem mantém o dinheiro parado está a perdê-lo todos os dias. A masterclass «Investir Agora» nasce precisamente desta urgência: mostrar que investir não é para poucos nem para génios da matemática. É, sim, uma ferramenta essencial para quem quer proteger o que tem e construir o que deseja. E o primeiro passo é vencer o medo, que muitas vezes nasce da falta de conhecimento. É acessível por ser gratuita, online, e qualquer pessoa que queira aprender a rentabilizar o seu dinheiro pode, e deve, participar.
No final de junho a CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), após analisar 150 conteúdos e cerca de 20 horas de vídeos (sites ou podcasts), detetou 33 famosos (finfluencers) nas redes sociais a dar conselhos e orientações sobre investimentos financeiros. Como explica este crescimento e como fazer para distinguir o trigo do joio, prevenindo eventuais burlas e fraudes? O caminho passa por dissuadir e sancionar as atividades de aconselhamento financeiro que não cumpram a lei?
Este crescimento é natural. Quando faltam respostas claras nos canais tradicionais, as pessoas procuram quem as simplifique. Mas essa procura pode tornar-se perigosa quando há falta de responsabilidade ou promessas ilusórias. A solução está também em educar quem ouve. O caminho é a regulação equilibrada, que proteja os consumidores sem travar a divulgação responsável. A vice-presidente da CMVM, Inês Drumond, esteve no nosso podcast MoneyBar, exatamente a falar sobre esse tema e concordamos que a literacia é a melhor forma de combater fraudes, e é também o que permite distinguir conteúdos de valor de simples espetáculo financeiro.
A profissão de contabilista certificado é regulada e de interesse público. Admite que os finfluencers possam ser percecionados, por alguma população, como concorrentes dos contabilistas certificados?
Não vejo concorrência, vejo papéis complementares. O contabilista certificado é um profissional técnico, com responsabilidades fiscais e legais cruciais para o funcionamento das empresas. Já o comunicador de literacia financeira atua no campo da educação, da consciencialização, da prevenção. Quando bem preparados, os finfluencers podem até reforçar o valor do trabalho dos contabilistas, ao preparar cidadãos mais informados e empresas mais organizadas. Acredito que haja espaço para convergência e para colaborações de sucesso.
Quais os erros mais comuns que identifica na gestão diária das pessoas em termos de finanças pessoais?
Um dos erros mais comuns é a falta de noção detalhada sobre o que se gasta e onde se gasta. Muitas pessoas vivem com a sensação de que «o dinheiro desaparece», mas nunca pararam para analisar os hábitos ou fazer um orçamento simples. Outro erro é não ter um fundo de emergência adequado, o que deixa as pessoas vulneráveis a qualquer imprevisto. Basta um problema de saúde ou uma reparação inesperada para se recorrer ao crédito, perpetuando um ciclo de endividamento.
A isto junta-se o desconhecimento absoluto sobre investimentos. Para uma grande parte da população, investir ainda é visto como algo arriscado, exclusivo ou «complicado demais». Isso leva a outro erro grave: manter o dinheiro parado, sem perceber que a inflação o está a corroer todos os dias. A ilusão de segurança acaba por sair cara.
Por fim, há uma ausência generalizada de planeamento e de clareza sobre objetivos financeiros. A literacia financeira começa precisamente aqui: entender onde se está, para onde se quer ir e como lá chegar com os recursos que se têm.
O facto de muitos portugueses auferirem o salário mínimo ou verem situado o seu vencimento no limiar dos mil euros, agravado com o aumento do custo de vida, é argumento de peso para que não se consiga poupar?
É, sem dúvida, uma limitação real, mas não tem de ser um impedimento absoluto. A poupança não depende apenas do valor que se ganha, mas também do hábito que se constrói. Mesmo que o montante seja pequeno, o simples ato de poupar com regularidade cria disciplina, visão de longo prazo e uma nova mentalidade em relação ao dinheiro.
É importante ter consciência de que existem três formas de melhorar a capacidade de poupança: reduzir despesas, aumentar o rendimento ou fazer ambos. Para quem já cortou ao máximo os custos, o foco tem de passar inevitavelmente por procurar novas formas de gerar rendimento, seja através de formação, reconversão profissional ou criação de fontes adicionais.
Claro que o Estado tem a responsabilidade de criar melhores condições — com rendimentos dignos, habitação acessível e políticas estruturais. Mas, enquanto isso não acontece, há escolhas individuais que podem fazer a diferença no presente e, sobretudo, no futuro.