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IVA - Isenções e direito à dedução
6 September 2017
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem

PT19174 - IVA - Isenções e direito à dedução
01-05-2017

Em 2012 foi criada uma empresa com o CAE 68200 - Arrendamento de bens imobiliários e enquadrada no regime normal de IVA. A finalidade da empresa é fazer a gestão dos imóveis que detém. Desde a sua constituição até a este momento apenas suportou os encargos com obras executadas por empresas de construção que emitiram faturas com IVA autoliquidação. Num futuro próximo, a empresa começará e emitir faturas referentes ao arrendamento a inquilinos particulares e empresariais. Estas faturas deverão ter IVA ou ficam isentas ao abrigo do artigo 9.º do CIVA? O facto de a empresa estar desde 2012 no regime geral de IVA, e ter deduzido o IVA das faturas com IVA autoliquidação, pode agora faturar os arrendamentos isentos de imposto?

Parecer técnico

No que diz respeito ao IVA, a locação de um imóvel enquadra-se no caráter residual do conceito de prestação de serviços definida no n.º 1 do artigo 4.º do respetivo Código, e como tal sujeita a imposto.

Contudo, como exceção das regras de incidência, o Código estabelece através do seu artigo 9.º, várias isenções, referindo-se o n.º 29 à locação de bens imóveis. Esta norma, por sua vez, prevê igualmente algumas exceções à isenção, que a seguir transcrevemos:

a) Prestações de serviços de alojamento, efetuadas no âmbito da atividade hoteleira ou de outras com funções análogas, incluindo parques de campismo;

b) A locação de áreas para recolha ou estacionamento de veículos:

c) A locação de máquinas e outros equipamentos de instalação fixa, bem como qualquer outra locação de bens imóveis de que resulte a transferência onerosa da exploração de estabelecimento comercial ou industrial;

d) A locação de cofres-fortes;

e) A locação de espaços para exposições ou publicidade.

Daqui se conclui que se o espaço cedido se encontrar devidamente equipado, no que resulta uma cedência de um conjunto de imóvel e de várias coisas móveis - equipamento e utensílios - com o objetivo de desenvolvimento de uma determinada atividade, isto é, se esta operação não se consubstanciar numa mera cedência de espaço de paredes nuas, mas antes, como já foi referido, na cedência de áreas devidamente preparadas e apetrechadas para o exercício de uma atividade comercial, inclui-se na previsão da alínea c) do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA, como um contrato de cessão de exploração, pelo que se encontra sujeita a IVA e dele não isento.

Por outro lado, a Administração Tributária entende que a locação de um imóvel se enquadra no n.º 29 do artigo 9.º do CIVA, independentemente, da natureza jurídica do negócio e do estatuto do locador, quando a característica predominante da operação económica consiste na colocação passiva do imóvel à disposição do locatário, em conformidade com o conceito de locação definido nos artigos 1022.º e 1023.º do Código Civil.

Este entendimento segue no mesmo sentido que a Jurisprudência Comunitária, a qual tem considerado que toda e qualquer prestação de serviços que esteja para além deste âmbito não deverá beneficiar da isenção, assim, se no contrato estiverem contempladas outras prestações de serviços indissociáveis da utilização dos espaços pelos utilizadores, nomeadamente, serviços de limpeza, manutenção, segurança e outros, a operação deve ser excluída da isenção prevista no n.º 29 do artigo 9.º do CIVA.

Este entendimento é corroborado por vários Despachos por parte dos serviços do IVA (ver Inf. Vinculativa n.º 3778, de 16/07/2012, do SIVA).

Deste modo, deverá averiguar-se o enquadramento em sede de IVA do contrato de arrendamento elaborado pela entidade com os arrendatários na cedência dos espaços, de modo à aplicação correta dos normativos atrás descritos. Ou, não havendo ainda contratos, segundo o destino que se pretende dar a cada uma das frações, sem prejuízo de, quando se realizarem tais operações de locação se corrigir o procedimento efetuado quando o destino for diverso do inicialmente previsto (ou regularizar o IVA a favor do Estado ou exercendo o direito à dedução).

Em termos do direito à dedução do IVA suportado, o exercício de atividades previstas no artigo 9.º do CIVA implica que não se possa exercer o direito à dedução do IVA suportado com a aquisição de bens e/ou serviços diretamente relacionados com essa atividade, atendendo a que se trata de operações que não conferem o direito à dedução, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA (a contrário).

O exercício de atividades tributadas, incluindo à taxa zero (p.e. exportações) implica o direito à dedução integral do IVA suportado com a aquisição de bens e/ou serviços diretamente relacionados com essas atividades, desde que cumpridos os restantes formalismos do artigo 19.º e seguintes do CIVA.

Se entidade exercer simultaneamente atividades isentas sem direito à dedução e sujeitas a IVA com direito à dedução, para deduzir o imposto suportado nas aquisições de bens e serviços tem de obedecer às disposições do artigo 23.º do CIVA.

Nos termos deste artigo 23.º do CIVA, o imposto suportado diretamente imputável às atividades isentas sem direito à dedução não poderá ser deduzido. O IVA suportado que seja diretamente imputável à atividade tributada (incluindo à taxa zero) com direito à dedução pode ser deduzido integralmente (100%), desde que cumpridos os restantes formalismos do artigo 19.º e seguintes do CIVA.

Quando a entidade suporte IVA em aquisições de bens e serviços utilizados na realização de ambas as atividades (tributada e isenta), esse IVA pode ser deduzido pelo método do pró-rata, nos termos da alínea b) do n.º 1 e n.º 4 do artigo 23.º do CIVA, ou em alternativa pelo método da afetação real (critérios objetivos de grau de utilização desses bens e serviços), previsto no n.º 2 do artigo 23.º do CIVA.

O IVA suportado na aquisição de bens e/ou serviços adquiridos para a realização em comum das atividades isentas e tributadas, nomeadamente em bens e serviços de caráter administrativo, deve ser deduzido através de percentagem determinada através de critérios objetivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, ou através de percentagem de pró-rata.

Tratando-se de operações imobiliárias, a entidade é obrigada a adotar o método da afetação real.

O Ofício-Circulado n.º 30103 de 23/04/2008, no capítulo V, vem indicar alguns critérios objetivos que podem ser utilizados na determinação do montante de imposto suportado a deduzir pela aplicação da regra do n.º 2 do artigo 23.º do CIVA.

Os critérios objetivos podem ser a área ocupada no edifício por cada uma das atividades (isenta e tributada), a massa salarial ou as horas de utilização de determinado bem.

Nos termos do no n.º 4 e 5 do artigo 12.º do CIVA, existe a possibilidade de a empresa optar pela renúncia à isenção das operações relativas à atividade isenta do arrendamento ou transmissão de imóveis, cumprindo com os requisitos e procedimentos previstos no "Regime da renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis" (Anexo ao Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29 de janeiro.

Se optar por esta renúncia à isenção, a empresa pode deduzir na totalidade o IVA suportado nas aquisições de bens e serviços relativas à totalidade do imóvel locado ou a transmitir, de acordo com as regras gerais do direito à dedução do artigo 19.º e seguintes do CIVA.

No caso em concreto, se parte do imóvel em construção for destinado a ser arrendado, e se estivermos perante uma operação isenta sem direito à dedução [alínea 29) do artigo 9.º do CIVA], o IVA suportado com as despesas de reparação, nomeadamente com a aquisição de materiais de construção e subcontratação de serviços, não pode ser deduzido, conforme a alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA (a contrário).

A exceção a esta não possibilidade de dedução do IVA será se o imóvel em causa for locado com recurso à opção pela renúncia à isenção de IVA nos termos do regime especial referido no Anexo ao Decreto-Lei n.º 21/2007. Mas como a renúncia só pode ser exercida quando for conhecido o locatário, só após a formalização da renúncia é que se poderá exercer o direito à dedução.

Assim, caso se tenha optado pela renúncia à isenção do IVA na locação da fração do imóvel, o IVA suportado com as obras de reparação pode ser deduzidos, atendendo às restantes regras do direito à dedução previstas no artigo 19.º e seguintes do CIVA.

Por exemplo, tratando-se de um imóvel que pode estar destinado a ser utilizado simultaneamente em atividades tributadas com direito à dedução, como é o caso do alojamento local, e em atividades isentas sem direito à dedução, pela venda das futuras frações ou arrendamento, o direito à dedução do IVA suportado com as obras nesse imóvel deve ser efetuado de acordo com os métodos do direito à dedução previstos no artigo 23.º do CIVA.

Como se tratam de operações imobiliárias, o sujeito passivo está obrigado a adotar o método da afetação real previsto no n.º 2 do artigo 23.º do CIVA, conforme entendimento veiculado pela Autoridade Tributária e Aduaneira através do Ofício-Circulado n.º 79.713 de 18/07/1989 dos Serviços do IVA.

De acordo com o referido método de afetação real, o IVA suportado no imóvel deve ser deduzido com base em critérios objetivos que permitam determinar o grau de utilização dessas obras em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito.

Esse grau de utilização pode ser determinado, por exemplo, em função da área do imóvel em causa que se prevê ser destinada às atividades tributadas com direito à dedução (alojamento local), por oposição às áreas que se preveja virem a ser utilizadas em atividades isentas sem direito à dedução, como a venda de frações ou do arrendamento dessas partes ou frações.

O Ofício-Circulado n.º 30103/2008 (capítulo V) prevê a utilização de alguns exemplos de critérios objetivos para definir o grau de utilização das despesas com as obras nas diferentes partes do imóvel afetos aos setores de atividade isentos ou tributados, nomeadamente a utilização da área ocupada no imóvel por cada um desses setores de atividade.

Em relação à parte do imóvel destinada a venda, determinada em função da área ocupada no atual imóvel em regime de propriedade vertical, a correspondente proporção do IVA suportado na realização das obras não pode ser deduzido, por se tratar de uma atividade isenta sem direito à dedução nos termos do n.º 30 do artigo 9.º do CIVA.

Quanto ao restante IVA suportado para a restante área ocupada, caso se possa, desde logo, efetuar uma estimativa da área do imóvel destinada à atividade de arrendamento, sendo esta também uma atividade isenta sem direito à dedução (n.º 29 do artigo 9.º do CIVA), a respetiva proporção do IVA suportado também não pode ser deduzido.

Caso não se possa atribuir uma determinada área do imóvel a uma atividade isenta sem direito à dedução, pode presumir-se a sua utilização em atividades tributadas com direito à dedução, nomeadamente na atividade de alojamento local, procedendo-se à dedução da respetiva proporção do IVA suportado.

Posteriormente, caso se destine essa parte do imóvel a uma atividade isenta sem direito à dedução, nomeadamente pela respetiva venda ou locação, a entidade deve proceder à regularização a favor do Estado, de uma só vez, do montante do IVA proporcional ao número de anos que faltem para completar o período de vinte anos a partir do ano em que iniciou a ocupação do imóvel (após as obras estarem concluídas, seguida de ocupação imediata), conforme previsto no n.º 5 ou alínea c) do n.º 6 do artigo 24.º do CIVA.

A regularização do IVA deduzido proporcional ao número de anos que faltem para completar o período de 20 anos só se aplica quando o imóvel tenha tido outra utilização antes de ser afeto à atividade isenta (o que não parece ser o caso), porque nos refere que até ao momento apenas suportou encargos com obras...).

Por exemplo, caso tenha ocupado o imóvel no ano de 2017, tendo deduzido a respetiva parte do IVA suportado nas obras realizadas, e venha a arrendar essa parte do imóvel (sendo esta uma operação isenta sem direito à dedução) no ano de 2017, deve proceder à regularização a favor do Estado de todo o IVA deduzido nas obras [cf. alínea c) do n.º 6 do artigo 24.º do CIVA].

Essa regularização deve ser efetuada na última declaração periódica de IVA do ano de 2017 (n.º 8 do artigo 24.º do CIVA).

Em bom rigor a empresa deveria rever o procedimento de dedução inicial do IVA (e respetivo enquadramento feito na declaração de inicio de atividade).

Se perspetivava realizar apenas operações isentas nos termos do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA não deveria ter deduzido qualquer IVA (e deveria ter corrigido, através de declaração de alterações o seu cadastro fiscal).

Claro que, o destino a dar aos imóveis desde a sua aquisição e realização de obras até à sua real afetação pode sofrer alterações.

Na perspetiva que os imóveis ainda não foram utilizados em qualquer atividade na empresa (ainda não houve ocupação do bem) nos termos do n.º 2 e n.º 3 do artigo 24.º do CIVA terá de proceder à regularização da totalidade do IVA deduzido nessas obras quando os imóveis forem afetos (integralmente) a atividade isenta nos termos do artigo 9.º do CIVA.

Se as obras continuam a decorrer e já se sabe que os imóveis vão ser usados em tais operações isentas ao abrigo do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA aconselhamos a que regularize, o quanto antes, todo o IVA deduzido e não proceda à dedução de qualquer IVA suportado na construção.

Ainda que possa vir a existir a possibilidade de renúncia à dedução não deverá existir qualquer dedução de IVA antes da formalização dessa renúncia (artigo 8.º do Regime de Renúncia à Isenção, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 21/2007).

O único argumento que possibilitaria a dedução do IVA suportado nas obras é a entidade destinar os bens a operações de locação não abrangida pela isenção do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA.