PT19174 - IVA - Isenções e direito à dedução
01-05-2017
Em 2012 foi criada uma empresa
com o CAE 68200 - Arrendamento de bens imobiliários e enquadrada no regime
normal de IVA. A finalidade da empresa é fazer a gestão dos imóveis que detém.
Desde a sua constituição até a este momento apenas suportou os encargos com
obras executadas por empresas de construção que emitiram faturas com IVA
autoliquidação. Num futuro próximo, a empresa começará e emitir faturas
referentes ao arrendamento a inquilinos particulares e empresariais. Estas
faturas deverão ter IVA ou ficam isentas ao abrigo do artigo 9.º do CIVA? O facto de a empresa estar desde
2012 no regime geral de IVA, e ter deduzido o IVA das faturas com IVA
autoliquidação, pode agora faturar os arrendamentos isentos de imposto?
Parecer técnico
No que diz respeito ao IVA, a
locação de um imóvel enquadra-se no caráter residual do conceito de prestação
de serviços definida no n.º 1 do artigo 4.º do respetivo Código, e como tal
sujeita a imposto.
Contudo, como exceção das regras
de incidência, o Código estabelece através do seu artigo 9.º, várias isenções,
referindo-se o n.º 29 à locação de bens imóveis. Esta norma, por sua vez, prevê
igualmente algumas exceções à isenção, que a seguir transcrevemos:
a) Prestações de serviços de
alojamento, efetuadas no âmbito da atividade hoteleira ou de outras com funções
análogas, incluindo parques de campismo;
b) A locação de áreas para
recolha ou estacionamento de veículos:
c) A locação de máquinas e outros
equipamentos de instalação fixa, bem como qualquer outra locação de bens
imóveis de que resulte a transferência onerosa da exploração de estabelecimento
comercial ou industrial;
d) A locação de cofres-fortes;
e) A locação de espaços para
exposições ou publicidade.
Daqui se conclui que se o espaço
cedido se encontrar devidamente equipado, no que resulta uma cedência de um
conjunto de imóvel e de várias coisas móveis - equipamento e utensílios - com o
objetivo de desenvolvimento de uma determinada atividade, isto é, se esta
operação não se consubstanciar numa mera cedência de espaço de paredes nuas,
mas antes, como já foi referido, na cedência de áreas devidamente preparadas e
apetrechadas para o exercício de uma atividade comercial, inclui-se na previsão
da alínea c) do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA, como um contrato de cessão de
exploração, pelo que se encontra sujeita a IVA e dele não isento.
Por outro lado, a Administração
Tributária entende que a locação de um imóvel se enquadra no n.º 29 do artigo
9.º do CIVA, independentemente, da natureza jurídica do negócio e do estatuto
do locador, quando a característica predominante da operação económica consiste
na colocação passiva do imóvel à disposição do locatário, em conformidade com o
conceito de locação definido nos artigos 1022.º e 1023.º do Código Civil.
Este entendimento segue no mesmo
sentido que a Jurisprudência Comunitária, a qual tem considerado que toda e
qualquer prestação de serviços que esteja para além deste âmbito não deverá
beneficiar da isenção, assim, se no contrato estiverem contempladas outras
prestações de serviços indissociáveis da utilização dos espaços pelos
utilizadores, nomeadamente, serviços de limpeza, manutenção, segurança e
outros, a operação deve ser excluída da isenção prevista no n.º 29 do artigo
9.º do CIVA.
Este entendimento é corroborado
por vários Despachos por parte dos serviços do IVA (ver Inf. Vinculativa n.º
3778, de 16/07/2012, do SIVA).
Deste modo, deverá averiguar-se o
enquadramento em sede de IVA do contrato de arrendamento elaborado pela
entidade com os arrendatários na cedência dos espaços, de modo à aplicação
correta dos normativos atrás descritos. Ou, não havendo ainda contratos,
segundo o destino que se pretende dar a cada uma das frações, sem prejuízo de,
quando se realizarem tais operações de locação se corrigir o procedimento
efetuado quando o destino for diverso do inicialmente previsto (ou regularizar
o IVA a favor do Estado ou exercendo o direito à dedução).
Em termos do direito à dedução do
IVA suportado, o exercício de atividades previstas no artigo 9.º do CIVA
implica que não se possa exercer o direito à dedução do IVA suportado com a
aquisição de bens e/ou serviços diretamente relacionados com essa atividade,
atendendo a que se trata de operações que não conferem o direito à dedução, nos
termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA (a contrário).
O exercício de atividades
tributadas, incluindo à taxa zero (p.e. exportações) implica o direito à
dedução integral do IVA suportado com a aquisição de bens e/ou serviços
diretamente relacionados com essas atividades, desde que cumpridos os restantes
formalismos do artigo 19.º e seguintes do CIVA.
Se entidade exercer
simultaneamente atividades isentas sem direito à dedução e sujeitas a IVA com
direito à dedução, para deduzir o imposto suportado nas aquisições de bens e
serviços tem de obedecer às disposições do artigo 23.º do CIVA.
Nos termos deste artigo 23.º do
CIVA, o imposto suportado diretamente imputável às atividades isentas sem
direito à dedução não poderá ser deduzido. O IVA suportado que seja diretamente
imputável à atividade tributada (incluindo à taxa zero) com direito à dedução
pode ser deduzido integralmente (100%), desde que cumpridos os restantes
formalismos do artigo 19.º e seguintes do CIVA.
Quando a entidade suporte IVA em
aquisições de bens e serviços utilizados na realização de ambas as atividades
(tributada e isenta), esse IVA pode ser deduzido pelo método do pró-rata, nos
termos da alínea b) do n.º 1 e n.º 4 do artigo 23.º do CIVA, ou em alternativa
pelo método da afetação real (critérios objetivos de grau de utilização desses
bens e serviços), previsto no n.º 2 do artigo 23.º do CIVA.
O IVA suportado na aquisição de
bens e/ou serviços adquiridos para a realização em comum das atividades isentas
e tributadas, nomeadamente em bens e serviços de caráter administrativo, deve
ser deduzido através de percentagem determinada através de critérios objetivos
que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em
operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse
direito, ou através de percentagem de pró-rata.
Tratando-se de operações
imobiliárias, a entidade é obrigada a adotar o método da afetação real.
O Ofício-Circulado n.º 30103 de
23/04/2008, no capítulo V, vem indicar alguns critérios objetivos que podem ser
utilizados na determinação do montante de imposto suportado a deduzir pela
aplicação da regra do n.º 2 do artigo 23.º do CIVA.
Os critérios objetivos podem ser
a área ocupada no edifício por cada uma das atividades (isenta e tributada), a
massa salarial ou as horas de utilização de determinado bem.
Nos termos do no n.º 4 e 5 do
artigo 12.º do CIVA, existe a possibilidade de a empresa optar pela renúncia à
isenção das operações relativas à atividade isenta do arrendamento ou
transmissão de imóveis, cumprindo com os requisitos e procedimentos previstos
no "Regime da renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens
imóveis" (Anexo ao Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29 de janeiro.
Se optar por esta renúncia à
isenção, a empresa pode deduzir na totalidade o IVA suportado nas aquisições de
bens e serviços relativas à totalidade do imóvel locado ou a transmitir, de
acordo com as regras gerais do direito à dedução do artigo 19.º e seguintes do
CIVA.
No caso em concreto, se parte do
imóvel em construção for destinado a ser arrendado, e se estivermos perante uma
operação isenta sem direito à dedução [alínea 29) do artigo 9.º do CIVA], o IVA
suportado com as despesas de reparação, nomeadamente com a aquisição de
materiais de construção e subcontratação de serviços, não pode ser deduzido,
conforme a alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA (a contrário).
A exceção a esta não
possibilidade de dedução do IVA será se o imóvel em causa for locado com recurso
à opção pela renúncia à isenção de IVA nos termos do regime especial referido
no Anexo ao Decreto-Lei n.º 21/2007. Mas como a renúncia só pode ser exercida
quando for conhecido o locatário, só após a formalização da renúncia é que se
poderá exercer o direito à dedução.
Assim, caso se tenha optado pela
renúncia à isenção do IVA na locação da fração do imóvel, o IVA suportado com
as obras de reparação pode ser deduzidos, atendendo às restantes regras do
direito à dedução previstas no artigo 19.º e seguintes do CIVA.
Por exemplo, tratando-se de um
imóvel que pode estar destinado a ser utilizado simultaneamente em atividades
tributadas com direito à dedução, como é o caso do alojamento local, e em
atividades isentas sem direito à dedução, pela venda das futuras frações ou
arrendamento, o direito à dedução do IVA suportado com as obras nesse imóvel
deve ser efetuado de acordo com os métodos do direito à dedução previstos no
artigo 23.º do CIVA.
Como se tratam de operações
imobiliárias, o sujeito passivo está obrigado a adotar o método da afetação
real previsto no n.º 2 do artigo 23.º do CIVA, conforme entendimento veiculado
pela Autoridade Tributária e Aduaneira através do Ofício-Circulado n.º 79.713
de 18/07/1989 dos Serviços do IVA.
De acordo com o referido método
de afetação real, o IVA suportado no imóvel deve ser deduzido com base em
critérios objetivos que permitam determinar o grau de utilização dessas obras
em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem
esse direito.
Esse grau de utilização pode ser
determinado, por exemplo, em função da área do imóvel em causa que se prevê ser
destinada às atividades tributadas com direito à dedução (alojamento local),
por oposição às áreas que se preveja virem a ser utilizadas em atividades isentas
sem direito à dedução, como a venda de frações ou do arrendamento dessas partes
ou frações.
O Ofício-Circulado n.º 30103/2008
(capítulo V) prevê a utilização de alguns exemplos de critérios objetivos para
definir o grau de utilização das despesas com as obras nas diferentes partes do
imóvel afetos aos setores de atividade isentos ou tributados, nomeadamente a
utilização da área ocupada no imóvel por cada um desses setores de atividade.
Em relação à parte do imóvel
destinada a venda, determinada em função da área ocupada no atual imóvel em
regime de propriedade vertical, a correspondente proporção do IVA suportado na
realização das obras não pode ser deduzido, por se tratar de uma atividade
isenta sem direito à dedução nos termos do n.º 30 do artigo 9.º do CIVA.
Quanto ao restante IVA suportado
para a restante área ocupada, caso se possa, desde logo, efetuar uma estimativa
da área do imóvel destinada à atividade de arrendamento, sendo esta também uma
atividade isenta sem direito à dedução (n.º 29 do artigo 9.º do CIVA), a
respetiva proporção do IVA suportado também não pode ser deduzido.
Caso não se possa atribuir uma
determinada área do imóvel a uma atividade isenta sem direito à dedução, pode
presumir-se a sua utilização em atividades tributadas com direito à dedução,
nomeadamente na atividade de alojamento local, procedendo-se à dedução da
respetiva proporção do IVA suportado.
Posteriormente, caso se destine
essa parte do imóvel a uma atividade isenta sem direito à dedução, nomeadamente
pela respetiva venda ou locação, a entidade deve proceder à regularização a
favor do Estado, de uma só vez, do montante do IVA proporcional ao número de
anos que faltem para completar o período de vinte anos a partir do ano em que
iniciou a ocupação do imóvel (após as obras estarem concluídas, seguida de
ocupação imediata), conforme previsto no n.º 5 ou alínea c) do n.º 6 do artigo
24.º do CIVA.
A regularização do IVA deduzido
proporcional ao número de anos que faltem para completar o período de 20 anos
só se aplica quando o imóvel tenha tido outra utilização antes de ser afeto à
atividade isenta (o que não parece ser o caso), porque nos refere que até ao
momento apenas suportou encargos com obras...).
Por exemplo, caso tenha ocupado o
imóvel no ano de 2017, tendo deduzido a respetiva parte do IVA suportado nas
obras realizadas, e venha a arrendar essa parte do imóvel (sendo esta uma
operação isenta sem direito à dedução) no ano de 2017, deve proceder à
regularização a favor do Estado de todo o IVA deduzido nas obras [cf. alínea c)
do n.º 6 do artigo 24.º do CIVA].
Essa regularização deve ser
efetuada na última declaração periódica de IVA do ano de 2017 (n.º 8 do artigo
24.º do CIVA).
Em bom rigor a empresa deveria
rever o procedimento de dedução inicial do IVA (e respetivo enquadramento feito
na declaração de inicio de atividade).
Se perspetivava realizar apenas
operações isentas nos termos do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA não deveria ter
deduzido qualquer IVA (e deveria ter corrigido, através de declaração de
alterações o seu cadastro fiscal).
Claro que, o destino a dar aos
imóveis desde a sua aquisição e realização de obras até à sua real afetação
pode sofrer alterações.
Na perspetiva que os imóveis
ainda não foram utilizados em qualquer atividade na empresa (ainda não houve ocupação
do bem) nos termos do n.º 2 e n.º 3 do artigo 24.º do CIVA terá de proceder à
regularização da totalidade do IVA deduzido nessas obras quando os imóveis
forem afetos (integralmente) a atividade isenta nos termos do artigo 9.º do
CIVA.
Se as obras continuam a decorrer
e já se sabe que os imóveis vão ser usados em tais operações isentas ao abrigo
do n.º 29 do artigo 9.º do CIVA aconselhamos a que regularize, o quanto antes,
todo o IVA deduzido e não proceda à dedução de qualquer IVA suportado na construção.
Ainda que possa vir a existir a
possibilidade de renúncia à dedução não deverá existir qualquer dedução de IVA
antes da formalização dessa renúncia (artigo 8.º do Regime de Renúncia à
Isenção, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 21/2007).
O único argumento que
possibilitaria a dedução do IVA suportado nas obras é a entidade destinar os
bens a operações de locação não abrangida pela isenção do n.º 29 do artigo 9.º
do CIVA.