Pareceres
Rendimentos do trabalho dependente
17 September 2025
Parecer técnico do departamento de consultoria da Ordem

Rendimentos do trabalho dependente
PT28634 - Julho de 2025

 

A alínea s) do artigo 46.º do Código Contributivo diz que as despesas resultantes da utilização pessoal de viatura automóvel fazem parte da base de incidência, desde que essa viatura gere encargos para entidade empregadora. O artigo 46.º-A do Código Contributivo define o que é «uso pessoal» e, neste sentido, entende-se que, para não ser considerado de uso pessoal e sair da base de incidência, é necessário que no acordo escrito não haja uma menção expressa da possibilidade de utilização para fins pessoais ou da possibilidade de utilização durante 24 horas. Caso o trabalhador tenha isenção de horário, também a utilização da viatura é afastada da base de incidência da segurança social. É também necessário que acordo escrito não haja menção expressa no acordo à possibilidade de utilização da viatura nos dias de descanso semanal. Sendo o acordo feito nestes moldes, mantém-se a isenção das tributações autónomas relativamente a estas viaturas?


Parecer técnico


A questão colocada está relacionada com o enquadramento fiscal na atribuição de uma viatura a um trabalhador da empresa. Questiona o enquadramento fiscal e em sede de Segurança Social. Questiona ainda se no caso de o trabalhador incorrer em despesas qual o enquadramento.
Para responder concretamente à questão colocada faremos o enquadramento genérico da tributação do trabalhador pela atribuição de viatura com acordo escrito.

Em termo fiscais, o artigo 2.º do Código do IRS trata dos rendimentos da Categoria A - Trabalho dependente, determinando que qualquer remuneração paga ou colocada à disposição do trabalhador proveniente da relação laboral existente, independentemente da designação, periodicidade ou frequência e natureza é tributada.

No n.º 3 do artigo 2.º do CIRS são identificados determinados tipos de rendimento, que também se consideram rendimentos do trabalho dependente, entre eles:
"b) As remunerações acessórias, nelas se compreendendo todos os direitos, benefícios ou regalias não incluídos na remuneração principal que sejam auferidos devido à prestação de trabalho ou em conexão com esta e constituam para o respetivo beneficiário uma vantagem económica, designadamente: (...)
9) Os resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador ou membro de órgão social de viatura automóvel que gere encargos para a entidade patronal, quando exista acordo escrito entre o trabalhador ou membro do órgão social e a entidade patronal sobre a imputação àquele da referida viatura automóvel."

Assim, para que a utilização de viatura automóvel constitua obrigatoriamente rendimento de trabalho dependente é necessário que exista acordo escrito entre o trabalhador ou membro do órgão social e a entidade patronal sobre a imputação da viatura.
De notar que também nas viaturas em renting, independentemente de configurar uma locação financeira ou uma locação operacional, pode ser celebrado o acordo escrito com o trabalhador ou com o membro de órgão social para utilização da viatura para uso pessoal.
O imprescindível é estarmos perante uma viatura que gere encargos para a entidade patronal, de acordo com o exposto no n.º 9) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS.

Para efeitos de quantificação dos rendimentos em espécie deverá considerar-se o disposto no artigo 24.º do CIRS.
Refere o n.º 5 do artigo 24.º do Código do IRS (CIRS) que "quando se tratar da atribuição do uso de viatura automóvel pela entidade patronal, o rendimento anual corresponde ao produto de 0,75% do seu valor de mercado, reportado a 1 de janeiro do ano em causa, pelo número de meses de utilização da mesma."

Assim, há que saber o valor de mercado da viatura para se poder aplicar esta fórmula, ou seja, corresponde ao produto de 0,75% do seu valor de mercado pelo número de meses de utilização da mesma. Sendo a sua fórmula de cálculo a seguinte:
Valor a Tributar = Valor de mercado (reportado a 1 de janeiro do ano em causa) x 0,75% x meses de utilização (assim como o proporcional do número de dias de utilização relativamente ao 1.º mês).
Refere-nos ainda o n.º 7 do artigo 24.º do CIRS, que "[n]a determinação dos rendimentos previstos nos n.ºs 5 e 6, considera-se valor de mercado o que corresponder à diferença entre o valor de aquisição e o produto desse valor pelo coeficiente de desvalorização acumulada constante de tabela a aprovar por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças."

A Portaria n.º 383/2003, de 14 de maio, publicada para esse efeito, contém os coeficientes a aplicar para determinação do referido rendimento, correspondendo o valor de mercado à diferença entre o valor de aquisição da viatura e o produto desse valor de aquisição pelo coeficiente de desvalorização acumulada correspondente ao n.º de anos do veículo (esta idade é aferida com referência à data de matrícula).

Constituindo as regalias em análise, rendimentos do trabalho dependente não sujeitos a retenção na fonte de acordo com o n.º 1 do artigo 99.º do Código do IRS, não há normativo que obrigue à sua menção no recibo de vencimento.

Contudo, devem ser mencionados na DMR com o "Código A66", sendo também indicado o valor das contribuições suportadas naquele mês com a Segurança Social (se sujeitos), pois estes montantes serão de atribuir mensalmente ao trabalhador.

Em termos contabilísticos, importa salientar que este tipo de rendimento em espécie não é objeto de registo contabilístico, pois trata-se de uma imputação técnica apenas para efeitos fiscais, podendo não corresponder, à utilização efetiva da viatura na esfera pessoal, e os gastos com a mesma já estão registados nas respetivas contas de gastos.

A declaração deste tipo de rendimentos é feita anualmente no anexo A da declaração de rendimentos Modelo 3 do trabalhador, conjuntamente com os restantes rendimentos da Categoria A, devendo a entidade patronal, nos termos do artigo 119.º do CIRS, fazer constar tais rendimentos, da declaração a entregar ao titular dos rendimentos.

Em termos de IRC e tendo em conta o disposto no artigo 23.º do Código do IRC (CIRC) "são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC".

Estes rendimentos, sendo tributados em IRS na categoria A, são gastos fiscalmente dedutíveis em sede de IRC, como gastos com o pessoal para efeitos do apuramento do lucro tributável da empresa, pelo que, não deverão ser acrescidos no quadro 07 da Modelo 22, nem estarão sujeitos a tributação autónoma, como nos refere especificamente a alínea b) do n.º 6 do artigo 88.º do CIRC, "6 - Excluem-se do disposto no n.º 3 os encargos relacionados com: (...) b) Viaturas automóveis relativamente às quais tenha sido celebrado o acordo previsto no n.º 9) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS."

Assim, fica determinada a exclusão da aplicação das taxas de tributação autónoma incidentes sobre viaturas (n.º 3 do artigo 88.º) relativamente a todos os encargos relacionados com viaturas automóveis relativamente às quais tenha sido celebrado o acordo previsto no n.º 9 da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS.

Em sede de Segurança Social, de acordo com o artigo 46.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (CC), Lei n.º 110/2009, para efeitos de delimitação da base de incidência contributiva consideram-se remunerações as prestações pecuniárias ou em espécie que nos termos do contrato de trabalho, das normas que o regem ou dos usos são devidas pelas entidades empregadoras aos trabalhadores como contrapartida do seu trabalho.

O n.º 2 do artigo 46.º do CC determina quais as prestações do trabalho dependente estão sujeitas a contribuições para a Segurança Social.
Assim, integram a base de incidência contributiva, designadamente, as seguintes prestações:
"a) A remuneração base, em dinheiro ou em espécie; (...)
s) As despesas resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador de viatura automóvel que gere encargos para a entidade empregadora nos termos do artigo seguinte. (...)
5 - Constituem base de incidência contributiva, além das prestações a que se referem os números anteriores, todas as que sejam atribuídas ao trabalhador, com carácter de regularidade, em dinheiro ou em espécie, direta ou indiretamente como contrapartida da prestação do trabalho."

Entendemos pela leitura da redação do n.º 5 do artigo 46.º do CC que estão igualmente sujeitas a incidência contributiva outras prestações que não tenham sido mencionadas anteriormente neste artigo 46.º, desde que tenham um carácter regular, pelo que, as despesas resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador de viatura automóvel estarão sujeitas a Segurança Social nos termos do artigo 46.º-A do CC (nomeadamente por existir acordo escrito).

Analisando o artigo 46.º-A do Código Contributivo, verifica-se:
"1 - Para efeitos do disposto na alínea s) do n.º 2 do artigo anterior, e sem prejuízo do disposto no número seguinte, considera-se que a viatura é para uso pessoal sempre que tal se encontre previsto em acordo escrito entre o trabalhador e a entidade empregadora do qual conste:
a) A afetação, em permanência, ao trabalhador, de uma viatura automóvel concreta;
b) Que os encargos com a viatura e com a sua utilização sejam integralmente suportados pela entidade empregadora;
c) Menção expressa da possibilidade de utilização para fins pessoais ou da possibilidade de utilização durante vinte e quatro horas por dia e o trabalhador não se encontre sob o regime de isenção de horário de trabalho.
2 - Considera-se ainda que a viatura é para uso pessoal sempre que no acordo escrito seja afeta ao trabalhador, em permanência, viatura automóvel concreta, com expressa possibilidade de utilização nos dias de descanso semanal.
3 - Nos casos previstos no número anterior, esta componente não constitui base de incidência nos meses em que o trabalhador preste trabalho suplementar em pelo menos dois dos dias de descanso semanal obrigatório ou em quatro dias de descanso semanal obrigatório ou complementar.
4 - O valor sujeito a incidência contributiva corresponde a 0,75% do custo de aquisição da viatura."
Face ao exposto, verifica-se que as normas em termos de Segurança Social não são coincidentes com o disposto no CIRS.
Sem prejuízo do acima exposto, no que respeita a eventuais obrigações e enquadramento em sede de Segurança Social, tratando-se duma questão que extravasa o âmbito fiscal e contabilístico da nossa análise, está fora do âmbito de funções do contabilista certificado nos termos do artigo 10.º do Estatuto da OCC, pelo que recomendamos que seja aferido diretamente junto do Instituto da Segurança Social, I.P.

Assim poderemos concluir que o facto de eventualmente não se considerar que a viatura possa ser considerada como para uso pessoal em sede de Segurança Social, pelo facto da a entidade empregadora não suportar integralmente os encargos com a viatura, na medida em que o tratamento fiscal, quer em sede de IRS que em sede de IRC, não depende de critérios relacionados com o suporte de encargos pela entidade empregadora, cumpridos os requisitos, ou seja, tenha sido celebrado o acordo previsto no n.º 9) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS o tratamento fiscal será o suprarreferido.

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