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6 Maio 2021
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23-04-2021

Determinada empresa pagou 19 900 euros por direitos de entrada num contrato de franchising. Da leitura do contrato conclui-se que este deveria ser contabilizado como ativo intangível. Contudo, será como ativo intangível com vida útil definida ou indefinida?
Como contabilizar a fatura? Qual o regime de amortização contabilística a utilizar? Qual a depreciação fiscalmente aceite?

Parecer técnico

A questão colocada refere-se ao tratamento contabilístico e fiscal de um contrato de franquia (franchising) na ótica da entidade franqueada (franchisada).
Visto que não é indicado o normativo contabilístico adotado pela entidade, iremos abordar esta temática no âmbito das normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF) previstas no aviso n.º 8 256/2015, de 29 de julho.
O contrato de franquia (franchising) visa, simultaneamente, uma cedência de know-how e prestação de serviços de assistência técnica, consubstanciando uma licença («direito de entrada») concedida para operar um determinado negócio, utilizando a marca, o sistema operacional, o apoio regular do franqueador e o direito de comercializar e de distribuir um produto ou serviço com aquele nome.
O direito de entrada pago pelo franqueado no início do contrato, constitui uma parte do rendimento resultante do contrato, podendo, eventualmente, ser devolvido, no todo ou em parte, caso o contrato seja rescindido.
Os recursos intangíveis, tal como os direitos de entrada de um contrato de franquia, devem satisfazer a definição de ativo intangível, nomeadamente identificabilidade, controlo sobre um recurso e existência de benefícios económicos futuros.
Para que um item seja reconhecido como ativo intangível devem, assim, ser verificados os seguintes requisitos (conforme disposto nos parágrafos 9 a 17 da NCRF 6 – Ativos intangíveis):
- A identificabilidade: um ativo, para se classificar como intangível, deve ser identificável. Um ativo intangível é identificável se for separável, isto é, capaz de ser separado ou dividido da entidade e vendido, transferido, licenciado, alugado ou trocado, seja individualmente ou em conjunto com um contrato, ativo ou passivo relacionado, independentemente da intenção da entidade de o fazer; ou se resultar de direitos contratuais ou de outros direitos legais, independentemente de esses direitos serem transferíveis ou separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações (é o caso de um intangível adquirido com um grupo de ativos, em que existem direitos legais perfeitamente identificáveis).
- O controlo: existe se a entidade puder obter os recursos relacionados com o ativo e restringir o acesso de outros aos benefícios de tal elemento. A existência de direitos legais sobre o bem reforça a condição de controlo, mas não é essencial.
- Os benefícios económicos futuros: o ativo intangível apenas se qualifica como tal se for provável que benefícios económicos futuros fluirão para a entidade. Os benefícios económicos futuros relacionados com o ativo intangível poderão incluir réditos da venda ou prestações de serviços, poupanças de custos ou outros benefícios resultantes do uso desse ativo pela entidade.
Em princípio, o direito de entrada cumpre o critério de identificabilidade, na medida em que resulta de direitos contratuais ou de outros direitos legais, independentemente de esses direitos serem transferíveis ou separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações, nos termos da alínea b) do parágrafo 12 da NCRF 6.
Visto que, pelo contrato de franquia, representado pelo pagamento do direito de entrada, a empresa obtém o direito contratual de utilização do referido know-how, podendo obter benefícios económicos futuros em resultado desse direito de utilização, pode dizer-se que existe o controlo do recurso intangível.
Os benefícios económicos futuros relacionados com o ativo intangível, conforme anteriormente referido, podem incluir réditos da venda ou prestações de serviços, poupanças de custos ou outros benefícios resultantes do uso desse ativo pela entidade. Neste caso, os benefícios económicos futuros estão relacionados com a possibilidade de a empresa poder utilizar a marca e os procedimentos do franqueador para comercializar os seus produtos ou serviços.
Deve atender-se que, no momento do reconhecimento e mensuração inicial do ativo intangível (direito de entrada), se pressupõe que existe uma grande probabilidade da empresa vir a obter benefícios económicos pela respetiva utilização, cumprindo-se portanto a definição de controlo do ativo intangível pela empresa e de obtenção de benefícios económicos futuros.
Como critério geral de reconhecimento dos ativos intangíveis, o parágrafo 21 da NCRF 6 estabelece que estes apenas devem ser reconhecidos como tal, quando seja provável que os benefícios económicos futuros relacionados diretamente com esse ativo intangível fluam para a entidade, e quando o custo desse ativo possa ser fiavelmente mensurado.
O custo desse item intangível adquirido separadamente da entidade pode ser mensurado com fiabilidade, uma vez que esse custo normalmente está definido em dinheiro ou em outros ativos monetários.
Em termos de mensuração, o ativo intangível deve ser registado inicialmente pelo seu custo, que inclui o preço de compra líquido de descontos, despesas acessórias e outros custos diretos necessários à preparação do ativo para ser usado pela entidade, ficando, de seguida, sujeito a amortizações.
Assumindo o pressuposto de que o item em causa cumpre os critérios de reconhecimento de um ativo intangível previstos na NCRF 6, então, teremos que aferir se a vida útil desse ativo intangível é finita ou indefinida, nos termos dos parágrafos 86 a 94 da respetiva norma.
Um ativo intangível com vida útil finita é amortizado nos termos dos parágrafos 95 a 104 da NCRF 6, e um ativo intangível com vida útil indefinida é amortizado nos termos do parágrafo 105 da mesma norma.
Um ativo intangível deve ser visto pela entidade como tendo vida útil indefinida quando, com base numa análise de todos os fatores relevantes, não houver limite previsível para o período durante o qual se espera que o ativo gere influxos de caixa líquidos para a entidade.
Conforme estabelece o parágrafo 89 da NCRF 6, o termo «indefinida» não significa «infinita». A vida útil de um ativo intangível reflete apenas o nível de dispêndio de manutenção futuro exigido para manter o ativo no seu padrão de desempenho avaliado no momento da estimativa da vida útil do ativo, e a capacidade e intenção da entidade para atingir tal nível. Uma conclusão de que a vida útil de um ativo intangível é indefinida não deve depender do dispêndio futuro planeado para além do exigido para manter o ativo nesse padrão de desempenho.
A vida útil de um ativo intangível que resulte de direitos contratuais ou de outros direitos legais não deve exceder o período dos direitos contratuais ou de outros direitos legais, mas pode ser mais curta dependendo do período durante o qual a entidade espera usar o ativo.
Podem existir tanto fatores legais como económicos que influenciem a vida útil de um ativo intangível. Os fatores económicos determinam o período durante o qual os benefícios económicos futuros serão recebidos pela entidade. Os fatores legais podem restringir o período durante o qual a entidade controla o acesso a esses benefícios. Conforme estabelece o parágrafo 93 da NCRF 6, a vida útil é o mais curto dos períodos determinados por estes fatores.
Deste modo, a partir do reconhecimento do ativo intangível, há que determinar um período de vida útil do "contrato de franquia”, representado pelo pagamento do "direito de entrada”, procedendo-se às respetivas amortizações em função dessa vida útil. A vida útil pode ser determinada pelo período previsto no contrato. Se incluir renovações, como é o caso concreto, há que considerar essas extensões de período, desde que não impliquem um custo significativo adicional.
Ao contabilista certificado cabe apenas informar o que estabelecem as normas contabilísticas. A estimativa do período de vida útil do ativo tem de ser aferida pela gerência da empresa, tendo em conta o contrato subjacente e a possibilidade das renovações.
Em termos fiscais, os ativos intangíveis são amortizáveis quando sujeitos a deperecimento, designadamente por terem uma vigência temporal limitada. A alínea b) do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, prevê que os elementos de propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo, sejam amortizados durante esse período de tempo.
De qualquer modo, desde 2016 que o parágrafo 105 da NCRF 6 prevê que os ativos intangíveis com vida útil indefinida devem ser amortizados num período máximo de 10 anos, aplicando-se-lhes, com as necessárias adaptações, o disposto nos parágrafos 95 a 104 da referida norma.
Tratando-se de um ativo intangível com vida útil indefinida, deve atender-se à possibilidade conferida no artigo 45.º-A do CIRC (apenas para ativos intangíveis aí referidos e quando adquiridos a partir de 1 de janeiro de 2014, inclusive) de aceitação fiscal (mera correção no quadro 07 da modelo 22) de 1/20 do custo de aquisição durante os primeiros 20 períodos de tributação após o reconhecimento inicial.
O registo contabilístico pode ser o seguinte:
Admitindo que o direito de entrada do contrato de franquia em causa cumpre os critérios de reconhecimento com ativo intangível, nos termos da NCRF 6:
- Débito da conta 44x – Ativos intangíveis – Direito de entrada, por contrapartida a crédito da conta 271 – Fornecedores de investimentos (ou conta 12 – Depósitos à ordem), pelo custo do direito de entrada contratualizado e faturado.
O IVA constante da fatura poderá eventualmente ser dedutível, com registo na conta 2432 – IVA – Dedutível, nos termos e condições do artigo 19.º e seguintes do respetivo Código.
Os valores mensais pagos, no âmbito do exercício da atividade pelo uso do contrato de franquia, devem ser considerados como encargos de royalties, a reconhecer como gastos no período a que dizem respeito, tal como definido contratualmente.
O registo contabilístico relativo aos royalties mensais do uso do contrato de franquia pode ser o seguinte:
- Débito da conta 6264 – Serviços diversos - Royalties, por contrapartida a crédito da conta 221 – Fornecedores c/c (ou conta 12 – Depósitos à ordem), pelo valor dos royalties determinados nos termos do contrato pago ou a pagar.