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Vendas à distância
29 Setembro 2021
Vendas à distância
21-09-2021

Uma empresa portuguesa vende os seus produtos através do sítio da Amazon para clientes particulares (B2C). Há mercadoria que sai do armazém de Portugal diretamente para a morada dos clientes, mas há mercadoria que é enviada para o armazém da Amazon em Espanha e são estes que tratam do envio para a morada dos clientes, tanto particulares espanhóis como clientes de outros países da União Europeia.
A empresa portuguesa tem o registo em Espanha para efeitos de IVA (representante legal), o qual até se pretendia cessar agora com a entrada do balcão único.
Como deve ser tratado o envio da mercadoria para o armazém da Amazon em Espanha? Como uma venda comunitária ou apenas uma transferência de armazém com uma guia de transporte?
Se tratado como uma venda comunitária, e em Espanha uma compra comunitária, temos que deixar de ter um representante legal e proceder ao registo da empresa em Espanha tanto em IVA como em imposto sobre o rendimento?
As vendas dos produtos que saem do armazém da Amazon de Espanha que são enviadas para outros consumidores finais situados noutros países da Comunidade, faturamos com o IVA desses países e declaramos no balcão único em Portugal, como fazemos com as mercadorias que saem diretamente do nosso armazém de Portugal? Se sim, efetuamos uma nota de crédito à venda comunitária e declaramos as vendas no balcão único?
Considerando que as respostas forem todas positivas, a margem de lucro na empresa espanhola é nula? É apenas considerada uma intermediária?

Parecer técnico

A Lei n.º 47/2020, de 24 de agosto, transpôs para a ordem jurídica interna os artigos 2.º e 3.º da Diretiva (UE) 2017/2455 do Conselho, de 5 de dezembro de 2017, e a Diretiva (UE) 2019/1995 do Conselho, de 21 de novembro de 2019, alterando o CIVA, o RITI e alguma legislação complementar relacionada com o IVA, no âmbito do tratamento do comércio eletrónico, introduzindo no artigo 3.º do Código do IVA (CIVA) os n.ºs 9, 10 e 11, relacionados com a utilização de interfaces eletrónicas para a realização de vendas à distância de bens importados e para a realização de transmissões de bens dentro da UE por um sujeito passivo não estabelecido na UE a uma pessoa que não seja sujeito passivo.
Para assegurar a efetiva cobrança do imposto devido nas transações efetuadas por intermédio de interfaces eletrónicas, estas passaram a ser consideradas sujeitos passivos pelas vendas à distância de bens importados, quer o fornecedor dos bens seja um sujeito passivo estabelecido na União Europeia ou em país ou território terceiro, e pelas vendas a consumidores finais efetuadas dentro da União Europeia por fornecedores não estabelecidos na União Europeia.
Para assegurar a cobrança eficaz e eficiente do IVA e reduzir os encargos administrativos dos vendedores, das administrações fiscais e dos consumidores, mostrou-se necessário envolver os sujeitos passivos que facilitam as vendas à distância de bens mediante a utilização de uma tal interface eletrónica na cobrança do IVA sobre essas vendas, estabelecendo que são eles os sujeitos que se considera que efetuaram essas vendas.
Para as vendas à distância de bens importados de territórios terceiros ou de países terceiros para a União Europeia, tal é limitado às vendas de bens expedidos ou transportados em remessas cujo valor intrínseco não seja superior a 150 euros, montante a partir do qual é exigida uma declaração aduaneira completa no momento da importação para fins aduaneiros.
Em face do exposto, podemos concluir que, nos termos dos aditados n.ºs 9 a 11 do artigo 3.º do CIVA, que entraram em vigor em 1 de julho de 2021:
- As plataformas eletrónicas que "facilitam” vendas à distância de bens importados em remessas de valor intrínseco não superior a 150 euros são consideradas o sujeito passivo por essas vendas, quer o fornecedor esteja estabelecido na União Europeia ou num pais terceiro;
- As plataformas eletrónicas que "facilitam” vendas na União Europeia (vendas à distância intracomunitárias de bens e vendas domésticas) por sujeitos passivos não estabelecidos na União Europeia são consideradas o sujeito passivo por essas vendas;
- Em ambos os casos, cria-se uma ficção jurídica, considerando-se que a plataforma adquiriu esses bens ao fornecedor e os transmitiu ao adquirente final.
Neste sentido, foi introduzida uma nova norma jurídica (artigo 14.º-A) na Diretiva IVA, que corresponde aos n.ºs 9 e 10 do artigo 3.º do CIVA, aditados pela Lei n.º 47/2020, de 24 de agosto, que prevê que, em determinadas circunstâncias, se considera que estes sujeitos passivos efetuam as entregas ou prestações pessoalmente e são responsáveis por contabilizar o IVA sobre estas vendas (cláusula do fornecedor presumido).
E que operações são abrangidas pela disposição do fornecedor presumido?
O sujeito passivo que facilita a entrega de bens mediante a utilização de uma interface eletrónica, como, por exemplo, um mercado, uma plataforma, um portal ou meios similares, é o fornecedor presumido no caso de:
- Vendas à distância de bens importados de territórios terceiros ou de países terceiros em remessas cujo valor intrínseco não exceda os 150 euros, habitualmente referidas como bens de baixo valor – n.º 9 do artigo 9.º do CIVA; ou
- Entregas de bens dentro da União Europeia por um sujeito passivo aí não estabelecido a uma pessoa que não seja sujeito passivo, abrangendo tanto as entregas internas de bens como as vendas à distância intracomunitárias de bens – n.º 10 do artigo 3.º do CIVA.
Em termos esquemáticos, temos:
O novo artigo 14.º-A da Diretiva IVA (que corresponde aos n.ºs 9 e 10 do artigo 3.º do CIVA), que introduz uma presunção para efeitos de IVA (a designada «cláusula do fornecedor presumido»), prevê que se considere sujeito passivo aquele que facilita a entrega recebeu e entregou pessoalmente esses bens (o denominado fornecedor presumido).
Tal significa que uma única entrega de bens do fornecedor (o denominado fornecedor subjacente) que vende bens através de uma interface eletrónica ao consumidor final (entrega B2C) é dividida em duas entregas:
- Uma entrega do fornecedor subjacente à interface eletrónica (entrega B2B presumida), considerada como uma entrega sem transporte, e
- Uma entrega da interface eletrónica ao adquirente (entrega B2C presumida), sendo esta a entrega com afetação de transporte.
Desta cláusula do fornecedor presumido resulta que o sujeito passivo que facilita a entrega mediante a utilização de uma interface eletrónica é tratado, para efeitos de IVA, como se fosse o fornecedor efetivo dos bens.
Tal implica que, para efeitos de IVA, se considera que o mesmo adquiriu os bens ao fornecedor subjacente e os vendeu subsequentemente ao adquirente.
Analisando o esquema apresentado anteriormente, conclui-se que a cláusula do fornecedor presumido não se aplica ao caso colocado no pedido em apreciação no presente parecer, uma vez que os bens não são expedidos a partir de um país ou um território terceiro para a União Europeia e os bens não são vendidos por um fornecedor não estabelecido na União Europeia.
Assim, no caso em apreciação a interface eletrónica não é um fornecedor presumido.

O regime da União

De conformidade com as Diretivas (UE) 2017/2455 e (UE) 2019/1995, ambas do Conselho, que foram transpostas para a ordem jurídica portuguesa pela Lei n.º 47/2020, de 24 de agosto, as operações abrangidas pelas novas disposições são as seguintes:
- As vendas à distância de bens importados de territórios terceiros ou de países terceiros efetuadas por fornecedores e fornecedores presumidos (conforme definidos no artigo 14.º, n.º 4, segundo parágrafo, da Diretiva IVA), com exceção dos bens sujeitos a impostos especiais de consumo;
- As vendas à distância intracomunitárias de bens efetuadas por fornecedores ou fornecedores presumidos (conforme definidos no artigo 14.º, n.º 4, primeiro parágrafo, da Diretiva IVA);
- As vendas de bens no mercado interno por fornecedores presumidos (ver o artigo 14.º-A, n.º 2, da Diretiva IVA);
- As prestações de serviços efetuadas por sujeitos passivos não estabelecidos na UE ou por sujeitos passivos estabelecidos na UE, mas não no Estado-membro de consumo, a pessoas que não sejam sujeitos passivos (consumidores finais).
Tendo em vista permitir uma correta interpretação das diretivas mencionadas no ponto anterior, a Direção-Geral da Fiscalidade e da União Aduaneira, da Comissão Europeia, divulgou, em setembro de 2020, um documento intitulado «Notas explicativas sobre as regras em matéria de IVA para o comércio eletrónico», no qual se pode ler que as novas regras, aplicáveis a partir de 1 de julho de 2021, alargam o âmbito de aplicação do regime da União de dois modos:
- O leque de entregas ou prestações de serviços que podem ser declarados ao abrigo do regime da União é alargado, nomeadamente:
· Além das prestações de serviços de telecomunicações, serviços de radiodifusão e televisão ou serviços eletrónicos, transfronteiras, um prestador pode também declarar todos os serviços transfronteiras prestados a pessoas que não são sujeitos passivos e que ocorram na UE.
· O fornecedor pode declarar todas as vendas à distância intracomunitárias de bens;
· As interfaces eletrónicas que se tornem fornecedores presumidos relativamente a entregas de bens efetuadas na UE podem declarar as vendas à distância intracomunitárias de bens, bem como certas entregas internas de bens no regime da União.
O âmbito dos sujeitos passivos (fornecedores ou prestadores) que podem utilizar o regime da União é alargado, conforme a seguir se indica.
Ainda segundo o documento referido no ponto anterior, o regime da União pode ser utilizado por:
- Um sujeito passivo estabelecido na UE (que não seja um fornecedor presumido) para declarar e pagar o IVA relativamente a:
· Prestações de serviços B2C que ocorrem num Estado-Membro no qual não está estabelecido;
· Vendas à distância intracomunitárias de bens.
Os serviços que são prestados a adquirentes num Estado-membro no qual o prestador está estabelecido têm de ser declarados na declaração de IVA nacional do respetivo Estado-membro, independentemente de o estabelecimento estável estar ou não envolvido na prestação dos serviços.
Um sujeito passivo não estabelecido na UE para declarar e pagar o IVA relativamente a:
· Vendas à distância intracomunitárias de bens.
Uma interface eletrónica (estabelecida na UE ou fora da UE) que facilita a entrega de bens (fornecedor presumido) relativamente a:
· Vendas à distância intracomunitárias de bens;
· Determinadas entregas internas de bens.
As entregas internas de bens, ou seja, quando os bens se encontram no mesmo Estado-membro do adquirente para o qual os bens são enviados, podem ser excecionalmente declaradas ao abrigo o regime da União, mas apenas por uma interface eletrónica relativamente às entregas de bens em que seja um fornecedor presumido.
Refere, de seguida, o mesmo documento que uma venda à distância intracomunitária de bens ocorre quando os bens são expedidos ou transportados pelo fornecedor ou em nome deste a partir de um Estado-membro que não seja o Estado-membro no qual acaba a expedição ou o transporte dos bens para o adquirente (artigo 14.º, n.º 4, primeiro parágrafo, da Diretiva IVA). O mesmo artigo prevê igualmente que a entrega de bens tem de ser efetuada a:
· Um sujeito passivo, ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo, cujas aquisições intracomunitárias de bens não estão sujeitas ao IVA nos termos do artigo 3.º, n.º 1, da Diretiva IVA; ou
· A qualquer outra pessoa que não seja sujeito passivo.
A alínea q) do n.º 2 do artigo 1.º do Código do IVA estabelece o conceito de «Vendas à distância intracomunitárias de bens», considerando como tais as transmissões de bens expedidos ou transportados pelo fornecedor ou por conta deste, inclusive quando o fornecedor intervenha indiretamente no transporte ou na expedição dos bens, a partir de um Estado-membro que não seja o Estado-membro de chegada da expedição ou transporte com destino ao adquirente, quando se verifiquem, simultaneamente, as seguintes condições:
- O adquirente não se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias no Estado-membro de chegada da expedição ou transporte dos bens, ou seja, um particular;
- Os bens não sejam meios de transporte novos nem bens a instalar ou montar.
Nestes termos, o fornecedor tem de ter intervenção, ainda que indireta, no transporte, embora possa debitar o transporte ao cliente.
Com efeito, da comparação do "velho” e do "novo” conceito de «vendas à distância intracomunitárias de bens» ressalta o facto de o novo conceito clarificar o alcance da expressão «expedição ou transporte dos bens» pelo fornecedor.
De acordo com o artigo 5.º-A do Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011, conhecido como o Regulamento de Execução do IVA, artigo esse aditado pelo Regulamento de Execução (UE) 2019/2026 do Conselho, de 21 de novembro de 2019, considera-se que os bens foram expedidos ou transportados pelo fornecedor ou por conta deste, inclusive se o fornecedor intervier indiretamente no transporte ou na expedição dos bens, em especial nos seguintes casos:
- Quando a expedição ou o transporte dos bens for subcontratada pelo fornecedor a um terceiro que entrega os bens ao adquirente;
- Quando a expedição ou o transporte dos bens for efetuada por um terceiro, mas o fornecedor assumir a responsabilidade total ou parcial pela entrega dos bens ao adquirente;
- Quando o fornecedor faturar e cobrar as despesas de transporte ao adquirente, repercutindo-os depois num terceiro que organiza a expedição ou o transporte dos bens;
- Quando o fornecedor promover, por qualquer meio, os serviços de entrega de um terceiro ao adquirente, puser em contacto o adquirente e um terceiro ou fornecer a um terceiro as informações necessárias para a entrega dos bens ao consumidor.
No entanto, os bens não são considerados expedidos ou transportados pelo fornecedor ou por sua conta se o adquirente transportar ele próprio os bens ou se o adquirente organizar a entrega dos bens com um terceiro e o fornecedor não intervier de forma direta ou indireta para efetuar ou ajudar a organizar a expedição ou o transporte desses bens.
O documento referido anteriormente («Notas explicativas sobre as regras em matéria de IVA para o comércio eletrónico»), divulgado, como se disse, pela Direção-Geral da Fiscalidade e da União Aduaneira, da Comissão Europeia, inclui vários exemplos de aplicação, entre os quais aquele que seguidamente se apresenta:
«10. Tenho uma empresa estabelecida (apenas) na Irlanda que efetua vendas à distância intracomunitárias de bens a adquirentes localizados em toda a UE através do meu próprio sítio Web e através de várias interfaces eletrónicas. O que muda para mim?
A partir de 1 de julho de 2021, o limiar estabelecido para as vendas à distância intracomunitárias de bens passa a ser de 10 000 EUR por ano, abrangendo todas as vendas à distância de bens efetuadas a adquirentes em todos os Estados-Membros da UE. Desaparece o limiar anual anterior de 35 000 EUR aplicado às vendas à distância para cada Estado-Membro (ou 100 000 euros para um número limitado de Estados-membros). Às suas vendas à distância de bens aplica-se o IVA dos Estados-membros para os quais os bens são expedidos/transportados. Tal significa que, no momento da venda, terá de aplicar ao adquirente a taxa do IVA correta do Estado-membro para o qual os bens serão expedidos/transportados. Para declarar o IVA, a empresa tem duas hipóteses:
a) Efetuar o registo em cada um dos Estados-membros em que tenha adquirentes (até 26 registos adicionais) e, em seguida, declarar e pagar o IVA devido através da declaração de IVA nacional de cada um dos Estados-membros; ou
b) Efetuar o registo para efeitos do regime da União. Trata-se aqui de um registo simples em linha, efetuado no portal espanhol do balcão único do IVA (país em que está estabelecido), podendo o balcão único ser utilizado em todas as suas vendas à distância de bens e em todas as prestações de serviços efetuadas a adquirentes de outros Estados-Membros da UE. Após o registo, poderá declarar e pagar o IVA devido sobre as vendas à distância de bens efetuadas em toda a UE através deste portal espanhol do balcão único.
O IVA é devido nos Estados-membros para os quais os bens são expedidos/transportados, independentemente do modo através do qual são efetuadas as vendas (sítio Web próprio ou interface eletrónica).
A empresa continua a ser o devedor do IVA relativamente a todas as vendas à distância efetuadas, independentemente do modo através do qual são efetuadas as vendas (sítio web pessoal ou interface eletrónica). Deve certificar-se de que é aplicado o IVA correto às vendas à distância efetuadas através das interfaces eletrónicas.
Caso opte por se registar para efeitos do regime da União, deve declarar e pagar o IVA devido sobre todas as suas vendas à distância através do balcão único, incluindo as que são efetuadas através de uma interface eletrónica.
A interface eletrónica não passa a ser um fornecedor presumido no cenário em apreço, uma vez que, o fornecedor está estabelecido na UE.»
A situação colocada no pedido em apreciação no presente parecer tem semelhança com o exemplo apresentado no ponto anterior.
Por outro lado, de conformidade com o que é referido no ponto 7 do Ofício-Circulado n.º 30 240, de 25/06/2021, da Área de Gestão Tributária – IVA, «Uma vez optando por esta modalidade no território nacional, devem ser declaradas todas as prestações de serviços B2C na UE, as vendas à distância intracomunitárias de bens, incluindo as que ocorrem no território nacional ou num Estado-Membro de estabelecimento, e as transmissões efetuadas pelas interfaces eletrónicas nos termos do n.º 10 do artigo 3.º do CIVA, incluindo as ocorridas no território nacional.»
Além disso, e de harmonia com o ponto 10 do mesmo ofício circulado, cada sujeito passivo só pode ter um Estado-Membro de identificação por regime, sendo que, no caso da empresa portuguesa, o Estado-Membro de identificação é Portugal.

Conclusão

Em face do exposto, todas as vendas efetuadas pela empresa portuguesa a clientes particulares (B2C) de outros Estados-membros, quer aquelas cuja mercadoria sai do seu armazém de Portugal diretamente para a morada dos clientes, quer aquelas cujos produtos são expedidos através do site da Amazon, estão abrangidas pelo Regime da União.
Como se disse antes, a Amazon não é, neste processo de venda, considerada um fornecedor presumido e quem tem de emitir a fatura aos clientes particulares (B2C) de outros Estados-membros é a empresa portuguesa, na qual terá de liquidar o IVA devido no Estado-membro para o qual são expedidos os bens com destino ao adquirente.