Pareceres
IVA - vendas à distância
21 Março 2025
Parecer técnico elaborado pelo departamento de consultoria da OCC.

IVA - vendas à distância
PT28378 - novembro de 2024

 

Determinado sujeito passivo vende, através de uma plataforma digital, plugins, modelos e mapas para servidores de Minecraft para Portugal, União Europeia e países terceiros, sendo basicamente todos eles consumidores finais.
Este tipo de produtos, uma vez que não há o transporte dos mesmos, podem ser considerados no regime de união - OSS?

 

Parecer técnico

 

A questão colocada refere-se ao novo regime das vendas à distância em vigor a partir de 1 de julho de 2021. No caso em concreto, segundo entendemos do exposto na questão, o sujeito passivo em causa efetua vendas através de plataformas online a particulares localizados em Portugal, na União Europeia e para países terceiros.
Pressupomos do exposto que se trata de serviços informáticos, pelo que se pode tratar de serviços prestados à distância (por via eletrónica).
Nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do Código do IVA (CIVA), o conceito de prestação de serviços é residual, na medida em que «são consideradas como prestações de serviços as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens.»
No que que se refere à venda de produtos digitais, consideramos estar perante uma prestação de serviços, face à inexistência física do produto. Não obstante, reconhecemos a característica híbrida da operação e que os nossos códigos fiscais possam não a prever objetivamente.
Iremos proceder ao enquadramento em sede de IVA, análise das regras de localização das operações e taxas de IVA aplicáveis, quando a operação se localiza em território nacional.
Recorremos ao artigo 7.º do Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 do Conselho de 15 de março de 2011 para clarificação do que se entende por serviços prestados por via eletrónica:
«(...) 1. Entende-se por “serviços prestados por via eletrónica” a que se refere a Diretiva 2006/112/CE, os serviços que são prestados através da Internet ou de uma rede eletrónica e cuja natureza torna a sua prestação essencialmente automatizada, requerendo uma intervenção humana mínima, e que são impossíveis de assegurar na ausência de tecnologias da informação.
2. O n.º 1 abrange, em especial, o seguinte:
a) Fornecimento de produtos digitalizados em geral, nomeadamente os programas informáticos e respetivas alterações e atualizações;
b) Serviços de criação ou de apoio à presença de empresas ou de particulares numa rede eletrónica, tais como um sítio ou uma página Internet;
c) Serviços gerados automaticamente por computador através da Internet ou de uma rede eletrónica, em resposta a dados específicos introduzidos pelo destinatário;
d) Concessão, a título oneroso, do direito de colocar um bem ou um serviço à venda num sítio Internet que funciona como mercado em linha, em que os compradores potenciais fazem as suas ofertas através de um processo automatizado e em que as partes são prevenidas da realização de uma venda através de um correio eletrónico gerado automaticamente por computador;
e) Pacotes de fornecimento de serviços Internet (ISP) em que a componente, telecomunicações, constitui um elemento auxiliar e secundário (ou seja, pacotes que vão além do mero acesso à Internet e que compreendem outros elementos, tais como páginas de conteúdo que dão acesso a notícias e a informações meteorológicas ou turísticas, espaços de jogo, alojamento de sítios, acesso a debates em linha, etc.);
f) Serviços enumerados no anexo I.
3. O n.º 1 não abrange, em especial, o seguinte:
a) Serviços de radiodifusão e televisão;
b) Serviços de telecomunicações;
c) Bens cuja encomenda e respetivo processamento sejam efetuados por via eletrónica;
d) CD-ROM, disquetes e suportes materiais similares;
e) Material impresso, tal como livros, boletins, jornais ou revistas;
f) CD e cassetes áudio;
g) Cassetes vídeo e DVD;
h) Jogos em CD-ROM;
i) Serviços de profissionais, tais como juristas ou consultores financeiros, que aconselham os seus clientes por correio eletrónico;
j) Serviços de ensino, em que o conteúdo do curso é fornecido pelo docente através da Internet ou de uma rede eletrónica (ou seja, por conexão remota);
k) Serviços de reparação física fora de linha de equipamento informático;
l) Serviços de armazenamento de dados fora de linha;
m) Serviços de publicidade, nomeadamente em jornais, em cartazes ou na televisão;
n) Serviços de assistência por telefone;
o) Serviços de ensino exclusivamente prestados por correspondência, nomeadamente utilizando os serviços postais;
p) Serviços tradicionais de vendas em leilão, assentes na intervenção humana direta, independentemente do modo como são feitas as ofertas de compra;
q) Serviços telefónicos com uma componente vídeo, também designados serviços de videofonia;
r) Acesso à Internet e à World Wide Web;
s) Serviços telefónicos prestados através da Internet (...).»
Pela consulta ao anexo I do Regulamento de Execução (UE) n.º 282/2011 do Conselho, de 15 de março de 2011, verificamos que este vem exemplificar cada um dos pontos do anexo II à diretiva 2006/112/CE, que na legislação nacional se encontra transposto através do anexo D ao Código do IVA.
Anexo II da diretiva 2006/112/CE - Lista indicativa dos serviços prestados por via eletrónica
«(...) 1) Fornecimento de sítios informáticos, domiciliação de páginas Web, manutenção à distância de programas e equipamentos;
2) Fornecimento de programas informáticos e respetiva atualização;
3) Fornecimento de imagens, textos e informações, e disponibilização de bases de dados;
4) Fornecimento de música, filmes e jogos, incluindo jogos de azar e a dinheiro, e de emissões ou manifestações políticas, culturais, artísticas, desportivas, científicas ou de lazer;
5) Prestação de serviços de ensino à distância(...).»
Face ao exposto, haverá que validar se os serviços em causa se consideram serviços prestados por via eletrónica nos termos referidos anteriormente, caso se confirme, importa proceder ao enquadramento nestes termos.
No que se refere ao enquadramento da operação em causa (prestação de serviços), em sede de IVA, devemos atender às regras de localização das prestações de serviços, que se encontram definidas no n.º 6 e seguintes do artigo 6.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA).
As regras do artigo 6.º do CIVA são aplicadas a serviços prestados ou adquiridos a entidades situadas em Estados-membros da União Europeia, bem como em países terceiros.
A alínea a) do n.º 6 deste artigo define como primeira regra geral de localização das prestações de serviços, a tributação no país do adquirente, desde que este seja sujeito passivo de imposto com sede, estabelecimento estável ou domicílio fiscal nesse país.
Na situação de o adquirente não ser um sujeito passivo de imposto [alínea b), n.º 6], a obrigação de liquidação do imposto e respetiva entrega ao Estado, passa para o prestador de serviços quando este tenha no território nacional a sede da sua atividade.
Nos números seguintes deste artigo são definidas exceções aplicáveis às duas regras gerais, exceções a serviços prestados a destinatários que não são sujeitos passivos do imposto e a serviços especificamente identificados.
As regras gerais patentes no n.º 6 do artigo 6.º do CIVA podem ser afastadas por aplicação das regras de exceção dos números seguintes da mesma norma. Assim, determinadas prestações de serviços devidamente identificadas devem ser enquadradas, caso as suas condições se verifiquem, nas normas (de territorialidade) em que as mesmas se inserem.
Nos números 7 e 8 do artigo 6.º do CIVA temos as exceções às duas regras gerais e nos números 9, 10 e 11 as exceções à regra geral das prestações de serviços efetuadas por sujeitos passivos a não sujeitos passivos.
Face ao exposto, os serviços por via eletrónica, quando prestados a sujeitos passivos, têm enquadramento na alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do CIVA, o que significa que se localizam no país onde o adquirente tenha a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio para o qual os serviços sejam prestados. Neste caso, a liquidação do IVA compete ao próprio adquirente.
Por sua vez, quando estas prestações de serviços são realizadas a não sujeitos passivos, são tributadas no lugar onde o destinatário está estabelecido ou tem o seu domicílio, conforme dispõe a alínea h) dos números 9 e 10 do artigo 6.º do Código do IVA.
A aplicação desta norma implicaria que os prestadores de serviços de telecomunicações, de radiodifusão e televisão e serviços por via eletrónica estivessem obrigados a registar-se em cada um dos Estados membros de residência ou domicílio dos respetivos clientes, não sujeitos passivos do imposto.
Assim, se a operação reunir os pressupostos para ser qualificada como prestação de serviços por via eletrónica, ou seja, se os serviços informáticos se consubstanciarem em prestação de serviços por via eletrónica, que tenha por destinatário um não sujeito passivo (particular), pode, em hipótese, subsumir-se numa derrogação à acima referida regra geral [alínea b) do n.º 6], que é a constante da alínea h) dos n.º 9 e 10 do artigo 6.º, relativa às prestações de serviços por via eletrónica [previstas no anexo D (do CIVA) - Lista exemplificativa de prestações de serviços por via eletrónica].
Importa ainda atender às regras de derrogação do artigo 6.º-A do CIVA, no caso de se considerar que a operação consiste na prestação de serviços por via eletrónica.
De forma a facilitar o cumprimento das obrigações declarativas relativas a tais prestações de serviços foi criado um mecanismo de balcão único para os operadores comunitários, com as alterações previstas na Lei n.º 47/2020, que permite proceder à entrega da declaração e ao pagamento do respetivo IVA no portal eletrónico da administração tributária do Estado membro da sede ou, na falta de sede, do estabelecimento estável.
Se o valor total líquido de IVA das prestações de serviços em causa não for superior, no ano civil anterior ou no ano civil em curso, a 10 mil euros, as mesmas serão tributáveis em Portugal, mesmo que os adquirentes sejam não sujeitos passivos, estabelecidos ou domiciliados noutros Estrados-membros da União Europeia.
Se for excedido o limite de 10 mil euros, aplica-se a regra geral da alínea h) dos n.ºs 9 e 10 do artigo 6.º do CIVA, sendo a operação localizada no território onde o adquirente esteja domiciliado.
Assim, em conformidade com a diretiva (UE) 2017/2455, que foi transposta para a ordem jurídica portuguesa pela Lei n.º 47/2020 (ver anexo I desta lei), passa a haver três regimes especiais:
- Regime especial aplicável às vendas à distância intracomunitárias de bens, às transmissões de bens num Estado-membro efetuadas por interfaces eletrónicas e aos serviços prestados por sujeitos passivos estabelecidos na União Europeia, mas não no Estado-Membro de consumo (Regime da União);
- Regime especial aplicável a serviços prestados por sujeitos passivos não estabelecidos na União Europeia (regime extra-União);
- Regime especial aplicável às vendas à distância de bens importados (regime de importação).
Os três regimes especiais indicados integram o mecanismo conhecido como «OSS - One Stop Shop», que vai substituir, a partir de 01/07/2021, o anterior mecanismo existente, designado por MOSS, também conhecido como mini balcão único.
De forma a facilitar o cumprimento das obrigações declarativas relativas a tais prestações de serviços foi, então, criado um mecanismo, o regime extra-União, aplicável a sujeitos passivos não estabelecidos na UE, que passou a permitir o cumprimento das obrigações decorrentes de todas as prestações de serviços, efetuadas a não sujeitos passivos, que sejam localizadas na UE.
Podem registar-se neste regime os sujeitos passivos não estabelecidos na UE, que não têm a sede da sua atividade, nem dispõem de um estabelecimento estável em qualquer Estado-membro, que prestem serviços a pessoas que não sejam sujeitos passivos, que se considerem localizados num Estado-membro em conformidade com as regras relativas ao lugar da prestação de serviços, que em Portugal se encontram estabelecidas no artigo 6.º do CIVA.
Esta modalidade do regime abrange todos os serviços assim prestados na UE, independentemente do Estado-membro de consumo.
Em síntese, as regras de localização aplicáveis às prestações de serviços por via eletrónica a adquirentes não sujeitos passivos são as seguintes:
• Sendo os serviços prestados a não sujeitos passivos de países ou território terceiros (por exemplo, EUA, Canadá e Brasil), o sujeito passivo português não liquidará imposto, por força do disposto na alínea h) do n.º 9 do artigo 6.º do Código do IVA, devendo mencionar na fatura a expressão «IVA - não sujeição - artigo 6, n.º 9, h) do CIVA.» O valor do serviço deverá ser mencionado no campo 8 do quadro 06 da declaração periódica do IVA. O prestador apenas tem obrigação de registo para efeitos de IVA em Portugal, que decorre do seu enquadramento como sujeito passivo, nos termos gerais.
• Se o sujeito passivo português prestar serviços de valor menor ou igual a 10 mil euros, mesmo que preste serviços por via eletrónica a adquirentes não sujeitos passivos da União Europeia, as operações são tributáveis em Portugal, por força do disposto no n.º 1 do artigo 6.º-A do CIVA. O prestador apenas tem obrigação de registo para efeitos de IVA em Portugal, que decorre do seu enquadramento como sujeito passivo, nos termos gerais.
• Se o sujeito passivo português prestar serviços de valor superior a 10 mil euros, sendo os serviços prestados a não sujeitos passivos domiciliados noutros Estados-membros da União Europeia, a operação é localizada no espaço fiscal do adquirente do serviço, dado o disposto na referida alínea h) do n.º 9 do artigo 6.º. Cabe ao prestador português liquidar o imposto à taxa do país da residência do adquirente do serviço. Para o efeito, ou o prestador se regista no país do adquirente do serviço, como sujeito passivo do imposto, e aí procede à liquidação e entrega do imposto devido, ou adere ao regime da União (OSS), caso em que liquidará e entregará o imposto em Portugal, mas à taxa em vigor no(s) país(es) do(s) adquirente(s) do serviço. Ou seja, ou se regista em cada um dos Estados-membros dos adquirentes e aí cumpre com as suas obrigações para efeitos de IVA ou adere ao OSS e cumpre, a partir de Portugal, com as obrigações para efeitos de IVA de todos esses Estados-membros.
• Sendo os serviços prestados a não sujeitos passivos domiciliados em Portugal, serão considerados localizados em território nacional, dado o disposto na alínea h) do n.º 10 do mesmo artigo 6.º, pelo que a empresa prestadora deverá liquidar imposto à taxa normal, nos termos gerais do Código do IVA.
Importa ainda referir que, nas prestações realizadas a adquirentes de países terceiros, há a observar a existência de uma exceção à exceção da alínea h) do n.º 9 do artigo 6.º do Código do IVA (conforme alteração dada à redação da alínea d) do n.º 12 do artigo 6.º), quando o adquirente dos serviços seja uma pessoa (sujeito passivo ou particular) estabelecida ou domiciliada fora da União Europeia, e desde que tais serviços sejam utilizados ou a sua exploração efetiva ocorra em território nacional - neste caso estes serviços serão aqui localizados.
Para se aferir acerca da utilização e exploração efetiva, foram aditados os números 14 e 15 do artigo 6.º do Código do IVA, que para melhor compreensão transcrevemos:
«14 - Para efeitos da alínea d) do n.º 12, considera-se que a utilização e exploração efetivas ocorrem no território nacional em situações em que a presença física neste território do destinatário direto dos serviços seja necessária para a prestação dos mesmos, nomeadamente, quando os mesmos sejam prestados em locais como cabines ou quiosques telefónicos, lojas abertas ao público, átrios de hotel, restaurantes, cibercafés, áreas de acesso a uma rede local sem fios e locais similares.
15 - Sendo o destinatário dos serviços uma pessoa que não seja um sujeito passivo dos referidos no n.º 5 do artigo 2.º, para além das situações abrangidas pelo número anterior, considera-se que a utilização e exploração efetivas ocorrem no território nacional quando se situar neste território o local em que aquele disponha de uma linha fixa instalada, o local a que pertença o indicativo da rede móvel de um módulo de identificação de assinante (cartão SIM), ou o local em que esteja situado um descodificador ou dispositivo similar ou, sendo este local desconhecido, para onde tenha sido remetido um cartão de visualização, através dos quais os serviços de telecomunicações, de radiodifusão ou televisão ou os serviços por via eletrónica sejam prestados.»
Assim, quando estamos perante serviços em que o adquirente/destinatário dos mesmos é residente num país terceiro (quer seja sujeito passivo ou consumidor final), em que seja possível confirmar que o local de utilização e exploração efetiva ocorre em Portugal, nos termos da alínea d) do n.º 12 do artigo 6.º do CIVA, a liquidação do imposto é efetuada na declaração periódica de IVA (nacional), aplicando-se a correspondente taxa de imposto (23%) prevista no artigo 18.º do CIVA.